Manuel Bandeira é o chamado “João Batista” da arte poética difundida a partir
da Semana de 22. Este representa a humildade e simplicidade da poesia brasileira, com
sua “força calma” (ARRIGUCI, 2000, p. 11) e seus poemas como obras fechadas, tal
como o próprio poema “O cacto”, que é analisado por Arriguci (2000), e que leva o
crítico a dar essa definição para a poesia de Bandeira. João Cabral de Melo Neto, apesar
de estar referenciado na terceira fase do modernismo, está posicionado como a oposição
total ao estilo de Manuel Bandeira, pois é um poeta caracterizado pela frieza, pelas
técnicas das “facas cabralinas”, com sua estética modeladora e sua pregação do “catar
feijão” como princípio rigoroso de escrita. Carlos Drummond de Andrade, no entanto,
apesar de vir cronologicamente após Bandeira e antes de Cabral, representa um tipo de
síntese das poesias dos dois autores, de Bandeira e de Cabral, pois sua poesia está entre
o olhar para a simplicidade das coisas, mas sem se esquecer das técnicas poéticas, ou
revisão artesanal da poesia. Drummond é, no entanto, o poeta
gauche
da geração
modernista, o poeta da pedra, mas que foi o pré-cursor eleito por A.F.F. como referência
maior de sua criação poética, como este deixa claro em entrevistas e no título e temática
de muitos poemas ao longo de sua obra poética.
Mas essa influência se inicia na infância de A.F.F., que conhece a poesia de
Manuel Bandeira e Carlos Drummond por meio de um disco com a recitação da poesia
dos dois autores, dado pelo pai de A.F.F. no seu aniversário de quinze anos, como
destaca Heloisa Buarque de Hollanda (2010). Ele se apaixona indubitavelmente pela
poesia de Carlos Drummond, no entanto a poesia de Drummond que A.F.F. ouvia nessa
momento não era a poesia elegante do período maduro de
A rosa do povo
, e sim a
poesia ríspida e difícil do período de
Alguma poesia
.
Assim inicia-se a elaboração da poesia de A.F.F., com atenção central na
palavra, como indica o título do primeiro livro,
Palavra
(1963 [2003a]), mas com certa
fúria corporal, que segundo Sebastião Uchoa Leite (2003), é mais explícita a partir do
livro
De corpo presente
(1975 [2003c]). A.F.F. parece, assim, negar a influência calma
da poesia de Bandeira, para arriscar-se na medição severa com a poesia
gauche
de
Carlos Drummond. Dessa condição de invenção enviesada por fortes presenças da
literatura brasileira, A.F.F. traça um caminho singular de invenção, tendo como carga
literária a presença poética e biográfica desses nomes que lhe influenciam.
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