ANTE-METAMORFOSE
– A POESIA DA DÚVIDA
Joana Prada Silvério (Mestranda)
UNESP/FCL – FAPESP
RESUMO: Este trabalho tem por objetivo analisar, de forma integrada, a atividade poética e a
atividade crítica de Jorge de Sena, a partir de uma perspectiva dialógica, em que os diversos níveis de
expressão comunicam-se entre si. Pensando a poesia seniana como uma forma de conhecer, assim
como aparece no metapoema “Os trabalhos e os dias”, em que o escrever é uma apreensão do mundo,
percebe-se que a crítica, nascida junto com essa atividade poética, não apenas revela aspectos
importantes acerca desse fazer poesia, mas, principalmente, decorre dele. Portanto, na extensa e
complexa obra de Sena, poesia e crítica podem ser pensadas lado a lado porque o ser poeta é o centro
do qual emanam todas as outras possibilidades.
PALAVRAS-CHAVE:
Jorge de Sena;
Metamorfoses
;
Ante-metamorfose
; poesia e crítica
A obra seniana pode ser vista como uma rede de vasos comunicantes, que tem na
palavra poética um centro irradiador de temas, preocupações ético-estéticas e, principalmente,
de uma cosmovisão. Assim, aceitando-se a obra poética como núcleo gerativo das demais
esferas produtivas, aceita-se também a afirmação de Sena (1977, p. 255): “Sucede que eu sou
um escritor português, e como escritor me considero sobretudo um poeta ― apesar de quantas
peças de teatro, contos, ensaios, livros e artigos de erudição eu tenho publicado [...]”. Além
disso, e considerando a importância do metapoema “Os trabalhos e os dias”, que aparece
como uma “primeira súmula [...] da poesia como um testemunho de linguagem”
(LOURENÇO, 1998, p. 41), percebe-se que o fazer poético está associado a uma apreensão
da realidade material circundante. Escrever poesia é, portanto, uma forma de conhecer, sendo
o poema o objeto decorrente daquilo que se apreendeu. Para tanto, faz-se necessário uma
postura vigilante, de quem se disponibiliza a interpretar sinais, mantendo diante da vida uma
atitude perscrutadora. Se o
testemunho de linguagem
representa essa postura crítica, a
metamorfose
promove a transformação como uma ferramenta necessária para a conquista de
um mundo novo. Portanto, se a poesia de Jorge de Sena está impregnada de um querer saber,
ou ainda, de uma tentativa de desvelamento, o mesmo se pode dizer sobre seus ensaios acerca
de questões literárias. Em ambos, manifesta-se uma igual vontade de compreender o quanto
de humanidade há em tudo que é fruto de uma atividade criadora. Dessa forma, nosso trabalho
tem por objetivo conjugar a prática poética e a atividade crítica seniana, a partir da
perspectiva de que essas duas esferas revelam “um compromisso firmado entre um homem e
o seu tempo” (SENA apud HATHERLY, 1995, p. 28). Para tanto, centramos a discussão nos
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