parêntesis dentro da “Oleogravura Italiana” em que o pensamento da poetisa viaja,
deixa o real e chega a outros patamares.
Nerval foi poeta francês que resgatou a mitologia grega e romana como fonte
de inspiração aos seus poemas. No livro “
Chimères
” (1854) de onde são tirados os dois
fragmentos que Cecília relembra, Nerval emprega o sincretismo religioso, sugestões de
alquimia e outras imagens que o tornam precursor do Simbolismo. Dizem os críticos
que o livro foi escrito em momentos de alienação. O primeiro trecho que Cecília retoma
foi tomado do poema “Mirtho”, dedicado a Vênus (que na mitologia romana recebia o
título de Murcia), relacionado a essa planta, o mirto. Vênus, deusa da beleza e do amor,
é lembrada no poema de Nerval no seu casamento com Hefesto ou Vulcano, o deus do
fogo. É como se o Vesúvio, vulcão ativo, situado no golfo de Nápoles, inundasse o rosto
da amada com “a luz do Oriente”, como “uvas pretas misturadas com o ouro” das
tranças de Vênus e deixasse a região de Posillipo com “mil luzes brilhantes” refletidas
no Mar Tirreno, como se lê na continuação da estrofe citada por Cecília -
à ton front
inondé des clartés d'orient, /aux raisins noirs mêlés avec l'or de ta tresse.
O segundo fragmento de Nerval foi retirado do poema “El desdichado” (“O
infeliz”), soneto que abre o livro
Chimères
. Em versos anteriores que não são citados
por Cecília, o eu-lírico, que se declara um exilado do mundo, diz que, nas horas de
maior dor (“Ma seule Ètoile est morte - et mon luth constellé/ porte le Soleil noir de la
Mélancolie”), hora sepulcral, fora consolado pelo “Tu”, sua amada. A ela roga que,
nessa hora lhe seja devolvido Posillipo e o Mar da Itália, “la fleur qui plaisait tant à mon
cœur désolé”, completa o verso da terceira estrofe. A importância de Posillipo para
Nerval é que, segundo alguns críticos, foi lá que o escritor teve um encontro amoroso
em uma de suas viagens e também foi onde tentou o suicídio. Posillipo, contudo, é lugar
mítico, é onde se acalma a dor – como vimos –, e é onde o mar, governado por Netuno,
possibilita o renascimento. Os excertos de Nerval, oportunamente relembrados por
Cecília, ampliam a compreensão dos últimos versos da “Oleogravura italiana”.
Estando no Posillipo, olhando os barcos no golfo, a escritora lembra-se da
Índia, do Oriente, já que chegara à Itália vindo de um simpósio sobre a obra de Gandhi.
Sabemos da admiração e da influência da cultura indiana no fazer poético ceciliano,
portanto, seu coração buscava o leste ou o Oriente, como traduziu Bizzarri:
Nel golfo
correvano barche/ sempre più verso Oriente...
. A tranquilidade daquela cena de
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