de transcendência. Viajar, para Cecília, é buscar romper os próprios limites e, portanto,
trata-se de uma entrada em si mesma, autoconhecimento. Lemos em “Caminhante”, de
Poemas Italianos:
Ando atrás de ti, Roma de altos ciprestes e largas águas,
como atrás de mim mesma,
algum dia, depois da minha morte. (MEIRELES, 1979, p. 118)
A poetisa Cecília Benevides de Carvalho Meireles (1901-1964) sempre esteve
envolvida com viagens. E não apenas viagens físicas, entre lugares reais, mas viagens
permeadas pelos pensamentos, mas nem por isso menos reais que aquelas. Mescla as
duas vertentes porque produz viagens dentro de suas viagens, trata de elementos e
sensações que o simples turista não apreende. Torna as viagens existenciais e permite
com elas, abordar outros temas, mais universais. “Esse olhar que procura estabelecer
uma relação de afeto com tudo o que vê, que se detém sem pressa em cada coisa, muitas
vezes dando destaque a objetos e/ou circunstâncias que certamente não atrairiam o olhar
do turista.” (GOMES, 2002, p. 103)
Os textos das viagens da escritora foram escritos durante as viagens ou tempos
depois, rememorando-as e publicando-as em jornais cariocas e paulistas. Tais crônicas
foram reunidas e publicadas há pouco mais de uma década (
Crônicas de Viagem
, 1999)
por Leodegário de Azevedo Filho, o que facilitou muito o trabalho dos pesquisadores.
Referente ao período italiano as crônicas estão quase todas agrupadas no volume 2 das
Crônicas
, embora haja outras no volume 3 e outras ainda, referenciadas na edição
bilíngue de 1968 e que, ao que parece, ainda não foram publicadas. Há ainda que se
lembrar que as datas indicadas nas crônicas elencadas por Azevedo Filho não
correspondem às datas em que foram publicadas por Cecília Meireles no
Diário de
Notícias
, jornal do Rio de Janeiro, o que pediria uma revisão.
A crônica, como a etimologia da palavra denuncia, está presa ao tempo. Junto
com a afetividade ou com a construção de vínculos que se dá entre a viajante e os
lugares vivenciados nessa viagem, Cecília deixa claro nas crônicas um dos temas
prediletos de sua lírica: a temporalidade e a angústia existencial que surge correlata a
ela: “A vida é rápida demais. Não se tem tempo para amar uma cidade. Tudo isto
desaparece logo, para ficar dubiamente na memória como um sonho desfigurado,” nos
diz a autora. (MEIRELES, 1999, p. 103) Além disso, para ela, o tempo exíguo não
permite contemplar/vivenciar objetos, pessoas e lugares com a devida satisfação.