I Anais do Simpósio de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa - SILALP - page 185

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do contexto das variadas tentativas de (re)organização das instituições políticas, sociais,
econômicas e militares, no país, que a voz de Sila buscará avidamente seu próprio
público, na esperança de, talvez, não só marcar uma diferença nas estratégias de
condução do país, mas, também, indicar caminhos para a superação dos traumas vividos
e perpetuados, remanescentes do período colonial.
Representação social, hibridismo e utopia
Silá é um escritor africano que fala diretamente ao seu leitor no exato momento
de insegurança de seu país em relação ao futuro. Para isso, ele propõe uma estrutura
romanesca que tem a língua portuguesa como principal arma de intervenção. Como é
sabido, a língua portuguesa na Guiné-Bissau não chega a ser dominada por mais de 10%
da população. Nas repartições públicas, embora se tenha estabelecido, oficialmente, o
uso da língua portuguesa, nota-se a presença marcante da língua crioula como principal
veículo de comunicação. Por outro lado, contrariando o número reduzido de falantes de
língua portuguesa, o impacto de uma obra escrita nessa língua é, no contexto bissau-
guineense, bastante significativo, pois a
intelligentsia
do país domina tanto o português
quanto o crioulo. Desse modo, uma obra literária escrita em língua portuguesa logo é
noticiada e “traduzida” no crioulo de Bissau, chegando, assim, rapidamente aos ouvidos
dos falantes da língua majoritária que, por diversas razões, não se expressam em língua
portuguesa, mesmo na variante local oferecida, mas a reconhece (ouve) e a vê
legitimada no país. A língua portuguesa, ao permitir uma codificação sistemática da
escrita, surge, então, como suporte ao crioulo, cuja padronização linguística ainda não
foi regulamentada. Além disso, pensando em outros contextos e comunidades, uma obra
expressa em língua portuguesa poderá logo dialogar com outras culturas que
compartilham, com variações distintas, a língua portuguesa, não necessitando, assim, do
trabalho custoso e demorado da tradução profissional.
Então, podemos indagar por que Sila optou por um português mais
estandartizado ao escrever
Eterna paixão
? Diferentemente de
A última tragédia
e de
Mistida
,
Eterna paixão
rompe momentaneamente com a estratégia do autor em tornar
mais visível o português praticado na Guiné-Bissau. Nessas obras, muitas palavras e
expressões decorrem de vocábulos de línguas étnicas ou advindos do crioulo. Podemos,
por exemplo, identificar expressões idiomáticas do crioulo “adaptadas” ao português.
Ou seja, em certos momentos, até chegamos a imaginar que se trata de um “estrangeiro”
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