188
desses estudantes não chegam a concluir o curso no exterior, ficando muitas vezes
clandestinos ou servindo de mão-de-obra barata no país que os acolheram. Há, também,
aqueles que retornam, como fez Didi. Nesse retorno, há a frustração do objetivo não
alcançado e, também, a difícil e talvez impossível reinserção na vida social e econômica
do país de origem. Como um deslocado, sofre uma rejeição dupla. Didi carrega,
portanto, os sinais dos ex-colonizados que foram banidos do grupo dos “Altos
Dignatários da Nação”. Torturado e desmoralizado, ele é, intelectualmente,
subaproveitado na própria terra. O personagem começa, então, a desenvolver uma
patologia psíquica típica, canalizando sua energia psicossocial na efusão de relações
amorosas fortuitas.
Do mesmo modo, Dan e até figuras públicas da política, são torturadas. A
descrição a seguir resume a atmosfera da violência praticada no país quando Dan faz
uma visita ao embaixador, homem que conhecera antes no exterior, agora preso e
torturado:
Ao entrar, Dan tinha tanta coisa para esclarecer, para perguntar ao
embaixador, mas o diálogo não fora possível entre os dois. Foi
obrigado a sair sem poder dizer nada do que pretendia, sem poder
perguntar ao embaixador quem lhe roubara aquele ar de charme e
competência que conhecera na América, e deixara o seu corpo com
tantas feridas naquela minúscula cela, com muita umidade e pouca
luz; queria que o embaixador lhe explicasse, com a eloqüência que lhe
era reconhecida, até quando é que a falta de diálogo e a ambição de
poder continuariam a produzir intentonas de golpe de estado. (SILA,
2002, p. 239).
Sila expõe, com esse exemplo, a chaga da situação pós-colonial: o desperdício
da experiência de indivíduos realmente comprometidos e preparados para contornar o
ponto-morto da vida pós-colonial.
Com o exemplo acima, bem como demais episódios que podemos colher ao
longo do livro, temos a convicção de que
Eterna paixão
não é um livro que trata, no
geral, dos problemas em África, como sugeriu o autor. Mesmo com nomes de
personagens comuns e de lugares inexistentes, a narrativa é um negativo fotográfico da
vida social e política da Guiné-Bissau das décadas após a luta de libertação. O livro é
construído à luz de um autor que, contraditoriamente, confessa que suas ficções
decorrem de suas próprias vivências. Logo, concluímos que as situações que aparecem
no romance guardam profunda conexão entre a vida do autor (como estudante e, depois,
como engenheiro agrônomo) e a história de seu país natal, Guiné-Bissau. Nesse sentido,
a representação presente no livro está calcada, primeiramente, na visão de um escritor