I Anais do Simpósio de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa - SILALP - page 182

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como uma flor mesmo num canteiro.
[...] (MELO NETO, 1994, p. 79)
Arménio Vieira, por sua vez, também reflete sobre a concepção de poesia:
E, por último, sem que isto seja o fim,
não há guarda-chuva, João,
contra os enguiços do poema,
[...] (VIEIRA, 2006, p. 24).
4. Considerações finais
Assim, como podemos comprovar, as relações entre Arménio Vieira e João
Cabral de Melo Neto são exemplos atuais de um diálogo muito mais abrangente,
complexo e extenso entre Brasil e Cabo Verde que vem se fortalecendo. Todos esses
diálogos entre os dois poetas exigem um levantamento de questionamentos acerca de
em que proporções e em quais temáticas a leitura de João Cabral de Melo Neto teve
repercussões na formação e na escrita poética de Arménio Vieira, de modo a tornar
identificáveis as medidas dialógicas enquanto troca e intercâmbio, nos moldes do
pensamento bakhtiniano, segundo o qual
o enunciado está ligado não só aos elos que o precedem mas também
aos que lhe sucedem na cadeia da comunicação verbal. No momento
em que o enunciado está sendo elaborado, os elos, claro, ainda não
existem. Mas o enunciado, desde o início, elabora-se em função da
eventual reação-resposta, a qual é o objetivo preciso de sua elaboração
(BAKHTIN, 2002, p. 320 - negritos nossos).
Um poeta, ao escrever e publicar sua obra, não espera um leitor inerte diante da
leitura de sua poesia, mas um leitor que de alguma forma concretize o caráter dialógico
da língua e da linguagem, um enunciado pede um retorno, “ele espera uma compreensão
responsiva ativa, constrói-se para uma resposta, seja ela uma concordância ou uma
refutação.” (FIORIN, 2006, p.32). Nesse sentido não há melhor leitor do que o
representado por Arménio Vieira, a relação entre os dois poetas ilustra perfeitamente,
portanto, esse caráter da língua.
Apesar de terem sido, ambos, Arménio e João Cabral, agraciados com o
Prêmio Camões, não há registro de nenhuma análise e estudo comparativo aprofundado
com base nas obras dos dois. Assim, considerando a imensa malha de diálogos
perceptíveis entre as obras desses poetas, justifica-se e reitera-se a importância deste
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