I Anais do Simpósio de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa - SILALP - page 101

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romance organizar e difundir seus temas, abrindo-se à complexidade, geralmente
conflituosa, das sociedades modernas, nomeadamente burguesas,em que este gênero
literário costuma inspirar-se.
São, portanto, os diversos discursos, o do autor, o do narrador e os das personagens
que introduzem o plurilinguísmo no romance. No discurso de cada um deles ressoam, ou
são identificadas outras vozes sociais. Segundo Bakhtin, a dialogização entre esses
discursos e línguas, por meio do qual o tema se movimenta, é o que singulariza o estilo do
gênero romanesco. Conforme declara o autor, “o romance é uma diversidade social de
linguagens organizadas artisticamente, às vezes de línguas e vozes individuais”
(BAKHTIN, 1993, p. 74)
E é por meio do plurilinguísmo que o romance organiza e difunde seus temas, ou
seja, é por intermédio das vozes do autor, do narrador, das personagens, dos gêneros e
estilos que se inserem no texto, que o todo romanesco se estrutura. Desse modo,
introduzido no romance, o plurilingüísmo é submetido a uma elaboração
literária. Todas as palavras e formas que povoam a linguagem são vozes
sociais e históricas, que lhe dão determinadas significações concretas e se
organizam no romance em um sistema estilístico harmonioso,
expressando a posição sócio-ideológica diferenciada do autor no seio dos
diferentes discursos da sua época. (BAKHTIN, 1993, p. 76)
Estes recursos permitem ao escritor fazer soar a sua própria voz e construir o seu
estilo. Em virtude disso, há que se pensar na “pessoa que fala no romance”e nas linguagens
e vozes que ressoam nesse discurso, pois o sujeito falante é um ser concreto, um homem
que ocupa um lugar no mundo, interage com tudo e com todos que o envolvem, possuindo,
portanto, uma consciência sócio-ideológica. E será pela palavra, como também pelas ações,
que vão eclodir as dúvidas e convicções de quem fala, às quais está subjacente o contexto
social que o circunscreve. O que se percebe, neste sentido, é que a linguagem do romance
acampa os diversos discursos, ideologicamente situados, sejam eles religiosos, políticos ou
outros, e representa-os criticamente.
Nesse contexto cabe discorrer também sobre a questão da identidade e diferença,
aspecto relativo aos estudos culturais, e que também poderão dar suporte à análise desejada,
uma vez que as obras “Mestre Tamoda” e
Manana
, ao representarem os discursos sócio-
históricos-culturais do período colonial em Angola, discutem a questão da aculturação, da
alienação e da resistência, notadamente no que se refere à identificação e manutenção de
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