Anais do VII Encontro do Cedap – Culturas indígenas e identidades - page 27

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[...] no Brasil e em outras nações americanas a independência implicou um
complexo equilíbrio de alianças e rupturas com metrópoles que eram fontes
de identidade política e cultural. Essa situação envolveu um processo muito
complicado de manutenção de alguns valores, destruição de outros e, ao
mesmo tempo, reconstrução de novos laços com o mundo europeu e o
sistema mundial de Estados-nação. Para conseguir isso, o Brasil, como
outras novas nações americanas, teria de levar em conta referências que
eram ao mesmo tempo distintas daquelas das antigas potências coloniais,
mas que, ainda assim, precisavam permanecer ligadas à Europa e ser
aceitas pelos padrões europeus. (2008, p. 299).
Assim, “O movimento de identificação nacional, portanto, ao mesmo tempo em que
realça o exótico da terra
brasílica
, o faz por meio de um código marcado pela modernidade
parisiense” (DECCA, 2002, p. 92). A origem da nação, tanto no discurso histórico como no
literário, parte de um contato fundador entre o elemento branco e o aborígene americano, no
qual o segundo desaparece e o primeiro tem a supremacia cultural. Podemos afirmar que
esse é um dos traços determinantes de
O Guarani
: o amor de um ameríndio por uma
europeia servindo de metáfora para o encontro das duas raças que constituirão a
nacionalidade brasileira.
Segundo Decca (2002), o Brasil buscou se diferenciar de Portugal de duas maneiras:
falando exaustivamente de si e ressaltando tudo o que é exótico, e buscando novas
referências na cultura parisiense, uma Europa marcada pelos signos da modernidade.
[...] vai se construindo uma tradição nacional a partir da figura do indígena,
absolutamente degradado e destituído cultural e materialmente falando. No
entanto, essa majestade é o elemento exótico mais importante de uma
literatura que se pretende fundadora da nacionalidade. Nessa
representação literária da realidade, o índio afigura-se ao mesmo tempo
como tradição e como elo majestoso para uma modernidade a se instaurar
distanciada da antiga identidade paterna, isto é, de Portugal. Os padrões
estéticos parisienses que acabaram moldando as representações literárias
e historiográficas brasileiras funcionaram como contrapontos à tradição
lusitana. (DECCA, 2002, p. 96).
A representação do índio como um elemento do passado se torna extremamente útil
para uma sociedade crescentemente interessada na questão de terras. Se a princípio é
reconhecido o direito de primazia dos índios sobre suas terras, ocorre, ao longo do século
XIX, um processo de espoliação gradual. Toda a sorte de subterfúgios será usada
.
[...] começa-se por concentrar em aldeamentos as chamadas “hordas
selvagens”, liberando-se vastas áreas, sobre as quais seus títulos eram
incontestes, e trocando-as por limitadas terras de aldeias; ao mesmo tempo,
encoraja-se o estabelecimento de estranhos em sua vizinhança; concedem-
se terras inalienáveis às aldeias, mas aforam-se áreas dentro delas para o
seu sustento; deportam-se aldeias e concentram-se grupos distintos; a
seguir, extinguem-se aldeias a pretexto de que os índios se acham
“confundidos com a massa da população”; ignora-se o dispositivo de lei que
atribui aos índios a propriedade da terra das aldeias extintas e concedem-
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