Anais do VII Encontro do Cedap – Culturas indígenas e identidades - page 22

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Isto é, há a necessidade de construção de uma memória social que vise legitimar o
novo regime. Isso implica, por outro lado, a seleção de determinados elementos e o
silenciamento de outros:
[...] o ato da recordação criativa implica também o esquecimento seletivo.
Caminhos políticos não trilhados são apagados dos mapas da história
oficialista, vozes dissidentes daquela época são silenciadas, grupos sociais
inconvenientes são eliminados do quadro ou suas ações são reconfiguradas
para entrar em harmonia com um cenário idealizado, mais perfeito.
(YOUNG, 2008, p. 268).
A construção de uma memória nacional pode ser um dos exemplos mais
significativos de como se opera um projeto que visa harmonizar elementos diversos e por
vezes contraditórios, numa teleologia da revolução nacionalista.
Se podemos afirmar como fato a construção de uma memória nacional, os conceitos
de
nação
e
nacionalismo
são mais controversos. Se Benedict Anderson (2008) descreve a
nação
como uma comunidade política imaginada, intrinsecamente limitada e soberana, e o
nacionalismo
como o nascimento de uma nova subjetividade, não é possível afirmar que tais
sentimentos estivessem presentes no momento da emancipação política dos países
americanos. Abordando especificamente o caso da independência mexicana, Young
defende que, se é possível encontrar tal sentimento no discurso político da elite, o mesmo
não ocorre com as visões subalternas da política. Isto é, o autor diferencia o “movimento
nacionalista” – programa de um segmento muito restrito da população – do nacionalismo em
si, entendido como uma identificação cognitiva e afetiva praticamente universal. Young
argumenta que não havia uma subjetividade nacionalista no grosso populacional mexicano
na década de insurreição na Nova Espanha, que resultou na independência mexicana em
1821.
A crença no papel histórico do Estado-nação constituiu um ponto de convergência
entre o pensamento da elite crioula e o pensamento revolucionário mais amplo do mundo
Atlântico, dentro do qual as ideias dos insurretos mexicanos crioulos em parte se formavam.
Isso, no entanto, estava totalmente ausente das ideias políticas populares e das formas de
identificação de grupos. O lugar central no pensamento das massas rurais mexicanas seria
ocupado pela lealdade à comunidade natal e à realeza mística com matizes messiânicos.
Do mesmo modo que com as formas constitucionais, porém, há poucos
indícios comprobatórios de que as idéias crioulas sobre a nacionalidade, a
soberania popular, a mexicanidade emergente ou a cidadania tivessem
qualquer repercussão, a não ser as mais imperceptíveis, nos conceitos
populares de identidade pessoal ou de comunidade. (YOUNG, 2008, p.
278).
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