203), que funciona igualmente bem como derivação prefixal. De fato, muitas das
criações mais bem sucedidas de Leminski podem ser enquadradas simultaneamente em
mais de um tipo, o que tem como resultado a ampliação da sua polissemia.
Acrescente-se ainda uma pequena amostra de seus neologismos por conversão
(ou “derivação imprópria”), o que, por sua natureza, só pode ser compreendido no
contexto frasal, como em “deus só dá nozes para quem
nogueira
(onde o substantivo
assume a forma de um possível verbo “nogueirar”), ou em “começou a
gibraltar
-se” (p.
171) em que o topônimo
Gibraltar
não sofreu nenhuma sufixação para ser tomado
como verbo no infinito, bastando apenas ser colocado na posição de oração objetiva
indireta de
começou
(reforçado pela posposição do pronome reflexivo
–se
). O mesmo
acontece, desta vez na segunda declinação, com
“devo lazer”
(p. 19), onde
lazer
funciona como oração objetiva direta de
devo.
Em outros casos, em que o substantivo
lembra formalmente conjugações verbais de outros modos que não o infinitivo,
devemos manter a hipótese da sufixação, mas sem deixar nunca de considerá-los casos
de conversão sintática. Na primeira pessoa do singular do presente do indicativo:
membro
e deslembro umas coisas”
(p. 93),
“eu
metro
esse persperto”
(p. 174); na
terceira pessoa do singular do presente do indicativo (a mais comum):
“chicotes
abstratos que o vento
epilepsia
nos ramos dos arbustos”
(p. 196),
“o arcoíris
grinalda
a perda de gravidade”
(p. 57),
“segrega e
cegonha
(p. 121);
“a geleia em pedra
guloseima
?”
(p. 181),
“a dor nas minhas lombardias se
noruega
(p. 101) etc.; na
terceira pessoa do singular do pretérito imperfeito:
“quem
bicharia
tamanha ninharia?”
(p. 142); no presente do subjuntivo:
“raio que os
esparta
(p. 144); e até no imperativo:
pênsil
bem” (p. 200) (por
pense bem
). Isso acontece mesmo num caso como
“uma
grandeza
espalhafato”
(p. 183), em que o substantivo, para ser entendido como verbo
na terceira pessoa, deve ser quebrado em
espalha
e
fato
(que passa a ser o objeto direto
de
espalha
). O substantivo, dessa maneira, é não apenas convertido em verbo, mas em
predicado completo. Isso implica não podermos mais ler ingenuamente uma frase como
“aqui,
caruncho
, ali,
carniça
(p. 147), sem pensar que tais substantivos possam estar
desempenhando o papel de verbos, respectivamente na primeira e na terceira pessoas,
ainda quando se trate de oração com sujeito oculto. Esse o tipo de leitura que uma obra
como o
Catatau
exige do seu leitor.
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