Segundo a leitura que Benjamin (2002, p.90) faz da teoria romântica e especialmente de
F. Schlegel, a ironia romântica pensada por F. Schlegel não tem conceito; se por um
lado a crítica destrói a obra em nome de uma unidade determinada, por outro a ironia se
eleva acima de todo condicionado e aproxima a obra da indestrutibilidade ao
encaminhar a reflexões infinitas que relacionam a obra à Ideia da arte objetivada na
forma. Essa relação requer a compreensão da obra de arte como um momento
significativo na história da arte e que, por isso, relaciona-se com as outras obras em sua
capacidade de servir de médium de reflexão.
Em
Tutaméia
, a ironia também resulta da perpétua corrida de obstáculos que a
crítica pode entender na chave romântica da recusa do condicionado em favor do jogo.
A Ideia da arte herdada do idealismo linguístico dos primeiros românticos deve-se a
uma concepção platônica de forma (
eidos
) inteligível naquele contexto nostálgico
quanto aos valores eternos que a modernidade nascente tornava relativos à história dos
sujeitos. A motivação mística da ironia visava tornar a obra indestrutível associando-a
ao espírito da arte. Como momento objetivo na obra, a ironia pode ser pensada como
índice de indeterminação ou recusa do condicionado e condição para a reflexão
contínua. Os índices com as epígrafes de Schopenhauer emolduram o conjunto de
fragmentos que é
Tutaméia
como se o enquadrasse à teoria romântica da forma
correspondente à aspiração ao absoluto. De motivação mística, a ironia romântica
atribuía a indestrutibilidade da obra à expressão suprassensível do espírito da arte, uma
ordem superior. Já a disposição dos títulos nos índices de
Tutaméia
indica uma ordem
arbitrária e deformada pelo ponto de vista do autor reiterado na interrupção da
sequência alfabética (J.G.R.). A respeito de como lemos a ficção de Rosa hoje, Hansen
faz a seguinte consideração:
Hoje, sua leitura pressupõe a complexidade crescente das
parcialidades contraditórias de suas interpretações e das condições
sociais de si mesma como leitura parcial feita quando o sentido
negativo da crítica moderna está eliminado, como outros projetos de
transformação social, pelas redefinições do capital. Em 1930, Beckett
dizia que seus contemporâneos eram decadentes demais para ler
Joyce. Em 2007, a banalidade unidimensional das linguagens “pós-
utópicas” continua decaindo triunfalmente da sua ausência de
transcendência estética. No futuro, quando as experiências voltarem a
ter identidade, as banalidades de hoje serão a pré-história ruinosa de si
mesmas no formidável saber dos signos das anamorfoses de Rosa.
1...,340,341,342,343,344,345,346,347,348,349 351,352,353,354,355,356,357,358,359,360,...445