prefácio “Aletria e hermenêutica” apresenta um não senso em tom de definição
filosófica: “
O
O
é
um buraco não esburacado
.”; outras assertivas de temática mítica a
concebem também por não senso:
O mundo é Deus estando em toda a parte.
O mundo, para um ateu, é Deus estando nunca em nenhuma parte.
(ROSA, 1979,
p.12)
O prefácio não conclui, mas conflui ou apresenta simultaneamente ideias com
históricos conflitivos. Do mesmo modo, as estórias encenam aproximações inusitadas
de ideias com humor no tratamento da ação dos protagonistas que pode ser mínima,
irrelevante ou mesmo contrária às expectativas dos demais personagens elaborados
como uma comunidade abismada a cada desfecho em que os heróis superam as
situações-limite iniciais. A
mimese
de categorias narrativas comunitárias pela estória
dribla a racionalidade aristotélica e a universalidade relativa dos discursos comunitários
ao optar por jogos e operações de não senso integrados à anedota ou à ação (
mytho
)
como atrativo principal. O objetivo dessa apresentação é considerar a relevância dos
referidos efeitos de poesia e transcendência na constituição dos mecanismos narrativos
da estória resumidos nas anedotas de abstração.
Antes de
Primeiras estórias
, as primeiras obras de Rosa abonaram algumas das
expectativas da crítica e do público formadas pela tradição regionalista quanto à
representação realista das regiões do interior brasileiro diante das quais as numerosas
inovações estruturais de
Tutaméia
podem ter parecido conservadoras por parecerem
redundar em puro jogo considerado evasivo ou mesmo reacionárias quando acusadas de
elitismo ou incomunicabilidade. Se
Tutaméia
tivesse apenas sido recebida como
literatura difícil, poderia ter sido celebrada como obra vanguardista e as primeiras
críticas já comparavam Rosa a Joyce e Mallarmé pelas experimentações de linguagem
que aproximam prosa e poesia.
Tutaméia
já foi relacionada às narrativas míticas em comparações com a
comédia clássica, com textos espiritualistas medievais e modernos em hermenêuticas
ocupadas de inúmeras combinações simbólicas, com o idealismo lingüístico dos
primeiros românticos alemães e com a recriação das mitologias pelas vanguardas.
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