Após uma longa “viagem” pela natureza do eu,
na quinta estrofe é mencionado
o “tu”. Sua aparição também se dá de maneira repentina. O leitor, até então habituado
ao enfoque do eu, vê-se agora diante de um interlocutor. Tal situação promove uma
ruptura com a lógica de leitura que havia sido estabelecida. Isso intensifica o caráter de
imprevisibilidade do poema:
Eras coisa tão sem forma,
tão sem tempo, tão sem nada...
– arco-íris do meu dilúvio! –
que nem podias ser vista
nem quase mesmo pensada.
Notamos que a descrição sobre o “tu” pauta-se na ambivalência. No primeiro
verso vemos a definição “coisa”, elemento que atribui ao interlocutor uma característica
que acaba por distanciá-lo do aspecto humano. Caracterizado dessa forma, o “tu”
parece mais próximo do indefinido ou do domínio em que as palavras tornam-se
insuficientes para qualquer tipo de conceituação. É válido lembrar que é uma constante
na poesia de Cecília Meireles a “consciência da insuficiência das palavras, incapazes de
traduzir a integridade do pensamento”, utilizando as palavras de José Maria de Sousa
Dantas. Em contrapartida, no terceiro verso (destacado por travessões e pelo ponto de
exclamação), encontramos uma definição para o “tu” bem demarcada: “–arco-íris do
meu dilúvio! –”. Descrito através de um fenômeno natural bastante singular, vemos que
o “tu” proporciona ao eu lírico cor e claridade, num cenário onde predomina o caótico e
a escuridão. O interlocutor, representado por um arco-íris pode sugerir sua capacidade
de promover serenidade, acolhimento, atenuando a conflitante experiência na qual, na
maioria das vezes, o eu está inserido. Entretanto, notamos que esse contato com o “tu”
faz parte do passado -“
Eras
coisa tão sem forma”. É ratificada, assim, a presença da
memória, bem como a valorização do passado sobre o presente. Apontamos também
que nesse poema a relação entre eu e “tu” é, sobretudo, construída a partir do olhar.
Antes do início da sétima estrofe, vemos a colocação de um único verso:
“Ninguém mais caminha?”. Esse tom indagativo pode não só novamente enfatizar o
sentimento de solidão, como evocar a não familiaridade do eu lírico em relação ao
caminhar (já apontada em “Que caminho estranho!”). É possível que esse sujeito
poético tenha preferência por navegar – atitude em contato com a vastidão e a
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