“subentende vários papéis, seja tratando-se de compor o texto ou de dizê-lo”
(ZUMTHOR, 2010, p. 234). Vale lembrar que os vendedores de folhetos,
numerosíssimos, são também muito eficientes na arte de narrar em público.
Nos poemas com fins satíricos, a interação poeta/ouvinte se reveste de um
significado mais amplo, visto que o poeta se esforça para desenvolver uma
performance
que sirva de suporte às imagens cômicas que ilustram suas narrativas. Zumthor observa
que a
performance
não se liga apenas ao corpo, mas, por ele, ao espaço, interação que
resulta na noção de teatralidade. À idéia de “teatralidade “subjaz à de reconhecimento
de um espaço de ficção previamente programado para a execução do que vai ser
representado. No caso do teatro, temos o espaço interno propriamente dito. Quando se
trata da leitura de um texto em público, no caso do cordel, temos a praça pública, lugar
reservado para os encontros fortuitos, para as encenações de rua, espaço programado
secularmente para esses fins. Espaço semiotizado que permite ao espectador perceber a
teatralização da cena e a teatralidade do lugar: “Situada num espaço particular, a que se
liga numa relação de ordem genética e mimética, a performance projeta a obra poética
num
cenário
” (ZUMTHOR, IDEM, p. 174).
A
performance
, continua Zumthor, “modifica o conhecimento. Ela não é
simplesmente um meio de comunicação: comunicando ela o marca”. Marcar, acentuar,
exagerar são procedimentos caros à sátira. No caso das performances cômicas, o
espectador/ouvinte é arrolado, passando a integrar o espetáculo, gesticulando, rindo,
tecendo comentários jocosos-destronadores a respeito do satirizado. Aqui o
leitor/ouvinte, pela sua participação ativa no processo – rindo, gesticulando – passa a
condição de co-autor da narrativa.
À maneira dos vendedores ambulantes, do latoeiro, dos amoladores de tesouras e
afiadores de facas, dos raizeiros de feira que apregoam as benesses dos seus ungüentos,
das ervas afrodisíacas, o poeta de cordel vende sua narrativa com o auxílio da voz e do
corpo, muitas vezes imitando a fala e os trejeitos de tipos secularmente estigmatizados
pela cultura popular. O vendedor de folhetos, ao atualizar narrativas do romanceiro
ibérico, dos
fabliaux
medievais, do anedotário popular, assume a posição de autor do
que está narrando, haja vista a atualização da narrativa pela voz e pela performance, no
entendimento de Zumthor.
Assim, diferentemente do que ocorre no âmbito da cultura letrada, na tradição
oral o conceito de poeta não fica reservado apenas àquele que compõe o texto poético.
O indivíduo que interpreta ou recita – prática bastante comum nas feiras e praças