de outros textos na forma de carona literária. Ela estava nos folhetos
mimeografados, distribuídos de mão em mão” (CAMPEDELLI, 1995, p. 27).
Um dos caminhos da poesia marginal foi a música popular brasileira. Ela
corroborou para a influência direta da década oitentista. Nascida na crise
econômica, social e cultural do país, a poesia brasileira de 1980 torna-se uma
travessia entre as décadas. A produção cultural desse momento se volta, sobretudo,
para a abertura definitiva da cultura estrangeira, com saliências para a norte-
americana. Finalmente, o
rock
invade o campo nacional; todavia, a capacidade de
apropriação, segundo Luiz Tatit (2004), permite que a música passe pelo processo
antropofágico, ganhando contornos brasileiros. Destarte, a poesia marginal, outrora
encerrada com a perda de grandes poetas, Torquato Neto e Ana Cristina César, é
expandida inconscientemente pelo grito bruto, rude e libertador do
rock
.
Em outras palavras, a poesia oral, durante a década de oitenta, é uma
hibridização entre a palavra marginal e a rocha poética do
rock
. Na união do signo-
de marginal e do som brusco, ocorre uma metamorfose. O que antes eram corpos
separados, agora são apenas um corpo, transformado em palavra poética. Renato
Russo é o colaborador direto dessa metamorfose, pois suas canções são o
resultado da metamorfose, porque são letras musicais, convertidas em poesia oral
na voz e na antimelodia roqueira. Logo as bases interpretativas não se prendem no
escrito, porque estão na voz que canta e encena a realidade moderno-
contemporânea.
Renato Russo não perde a rebeldia e a brutalidade dos acordes dissonantes
do
rock
. Reaproveita-as e imprime a voz decantada da bossa nova, a voz próxima à
fala comum do cotidiano, o grau zero da melodia. Une dissonância instrumental e
voz decantada. Constrói uma palavra poética de fuga, libertação e utopia.
QUERO ME ENCONTRAR MAS NÃO SEI ONDE ESTOU/ VEM COMIGO
PROCURAR ALGUM LUGAR MAIS CALMO/LONGE DESSA CONFUSÃO/ E
DESSA GENTE QUE NÃO SE RESPEITA/TENHO QUASE CERTEZA QUE EU/
NÃO SOU DAQUI.
O fragmento pertence à canção
Meninos e Meninas
, gravada em 1989. Nela,
a procura pela identidade em um meio social hostil compõe a teatralização do ser
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