I Anais do Simpósio de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa - SILALP - page 83

82
DIALÉTICA DAS TENSÕES RACIAIS COMO ESTRUTURANTES DE NGOLA
KILUANJE: UMA LEITURA MATERIALISTA DE JOÃO MELO
Emiliano Augusto Moreira de Lima (Universidade de São Paulo, Faculdade de Filosofia,
Letras e Ciências Humanas, Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas, Programa de
Estudos Comparados de Literaturas de Língua Portuguesa)
RESUMO: O principal elemento organizador de Ngola Kiluanje são as tensões provocadas pelas
configurações raciais legadas pelo colonialismo português. Pretendemos analisar como elementos
externos ao texto tornam-se internos a ele, passando a estruturá-lo, e investigar como contradições
sociais decantam-se nas formas literárias, fortalecendo-as ou enfraquecendo-as. Situações narrativas
resolvidas por
Deus exmachina
, finais abruptos e outras soluções apontam para uma fragilidade do
texto escrito, ou para outras causas mais profundas?
Palavras-chave: João Melo; Literatura angolana; Crítica materialista.
O tema que atravessa o conto NgolaKiluanje são as tensões provocadas pelas
configurações raciais. Embora os narradores tratem mais diretamente de Angola, devem ser
pensadas também as contradições brasileiras, que é o espaço onde um dos narradores se
encontra e de onde narra a estória.
Não é a primeira vez que se fala sobre esse conto. Destaco aqui duas autoras que em
seus trabalhos estudaram-no, Emanuelle Rodrigues dos Santos e Cibele Verrangia Corre da
Silva. Ambos são excelentes trabalhos sobre João Melo, e ambos selecionaram o conto
NgolaKiluanje como parte do
corpus
a ser analisado. Quanto ao conto especificamente, dos
Santos vê nele a desconstrução do discurso sobre o preconceito em Angola, o que é
aceitável, mas acaba por colocar no mesmo plano o preconceito brancos contra negros e o
preconceito negros contra brancos – podem até ser equiparados na ordem do puramente
discursivo, mas quando entramos em contato com a realidade concreta, tal equiparação é
altamente problemática. Da Silva percebe que essa equiparação é um passo problemático, e
podemos notar seu incômodo nas aspas que usa ao dizer que o conto trata de racismo “às
avessas”. Como a contradição persiste, achamos que valia explorá-la em mais um trabalho.
O conto é divido em sete partes, separadas por um asterisco centralizado, entre duas
linhas de espaçamento. Na primeira parte, um dos narradores, de nome António Manuel da
1...,73,74,75,76,77,78,79,80,81,82 84,85,86,87,88,89,90,91,92,93,...196
Powered by FlippingBook