I Anais do Simpósio de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa - SILALP - page 26

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sociedade encontrando qualquer tema que sirva de matéria, e revelando o que de obscuro
possa existir:
A comédia visa as realidades do seu tempo mais do que qualquer outra
arte. Por mais que isso a vincule a uma realidade temporal e histórica, é
importante não perder de vista que o seu propósito fundamental é
apresentar, além das efemeridades das suas representações, certos
aspectos eternos do Homem que escapam à elevação poética da epopéia e
da tragédia. (JAEGER, 2001, p.414)
Neste tocante cabe destacar que o testamento é que revela o verdadeiro caráter de
Napumoceno, uma figura de vida dupla e conduta duvidosa. A personagem da comédia é retrato de
homens inferiores, acometidos de falhas, vícios e defeitos e por esse motivo, o protagonista de
OTSN
pode ser encarado como um anti-herói ou herói às avessas, sem atitudes nobres e atos de
honra. Ainda assim, Napumoceno tenta manter sua boa imagem, que é desmascarada pelo leitor a
partir de comentários do narrador e por algumas de suas atitudes inusitadas. Surge desta forma,
uma comicidade de caráter por parte de Napumoceno, pois a personagem tenta conservar a todo
custo uma boa imagem pública, e esta é desmascarada pelo leitor ao decorrer de todo o romance. A
quebra de padrões é uma característica do gênero cômico, assim sendo, tanto a configuração de
Napumoceno em anti-herói como as descaracterizações ao longo de toda narrativa conserva o
diálogo com este gênero.
A inserção da música na obra também é engenhosa no que concerne o gênero cômico. Na
comédia, tantos os espetáculos quantos as músicas são associadas ao riso por remeterem à alegria e
ao prazer. Além disso, são responsáveis por uma quebra e por um rompimento do convencional,
geralmente em situações de celebração, sobretudo se esta ocasião pede uma seriedade que é desfeita
pela descontração da música. Em
OTSN
há o trecho que traz a situação do enterro da personagem
principal, porém, a partir da escolha da música para a cerimônia, se sucede uma situação cômica:
[...] ele poderia provar quanto já se esforçara para satisfazer o defunto
mostrando aos presentes os três carregadores que transportavam um
enorme gravador e dois pesados mas potentes altifalantes.Porque o
cumprimento da primeira ordem por ele deixada esbarrou com um
imprevisto e quase intransponível obstáculo, pela razão simples de a
primeira vista ultrapassar as possibilidades locais.[...] Mas assim só dizer
ao chefe da banda que a música da viagem era apenas a marcha fúnebre.
Ora a contrariedade surgiu foi quando o chefe perguntou o que era isso de
marcha fúnebre a Carlos, já elucidado, respondeu ligeiro que era qualquer
coisa de um tal Beethoven.Nós não tocamos nada disso, objetou o chefe.
Nos enterros estamos habituados a tocar
djosa quem mandób morrê
. E
essa tal marcha fúnebre nunca ouvi falar. Aliás é um disparate . Se toda
gente vai com
djosa
e nunca houve reclamações, por que o Sr.
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