I Anais do Simpósio de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa - SILALP - page 36

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sendo muitas vezes necessário formular novas hipóteses particulares capazes de defini-la
formal e conteudisticamente.
II.
O perfil social do emigrado
Os três romances de Teixeira de Sousa estão situados cronologicamente no
período colonial (
Na Ribeira de Deus
), no pré-independência (
Ilhéu de Contenda
) e no pós-
independência (
Xaguate
) de Cabo Verde; apesar de essa não ser a sequência em que as
obras foram escritas e publicadas, esta leitura será organizada em torno da cronologia
interna à elaboração narrativa da trilogia. A possível explicação que se pode dar para essa
acronologia imbricada na sequência de publicação das obras, está alicerçada no próprio
método discursivo organizado pelo autor: a narrativa memorialística, que por excelência
não é linear.
Na Ribeira de Deus
(1992), na sequência em que foi publicado, é o romance que
encerra a trilogia. Contudo, a sua diegese está voltada para uma época (1918/1920) em que
a administração da vila de S. Filipe se subordinava à elite branca dos sobrados, a qual
constituía uma espécie de representantes locais do empreendimento colonial português.
Observa-se a referência sutil ao regressado que retorna endinheirado, apontando para a
formação de um novo grupo de caboverdianos que, progressivamente, passa a representar
um importante papel na vida social, econômica e política do arquipélago.
Na organização sistemática das suas obras, nota-se que Teixeira de Sousa procurou
traçar perfis sociais para melhor representar as funções desempenhadas na constituição da
sociedade foguense pelas diferentes categorias sociais que a compunham.
Nesse primeiro momento histórico representado na trilogia – resgatado e
interpretado segundo um trabalho estético-literário, não o esqueçamos – a presença do
emigrado está basicamente sinalizada pelo dinheiro estrangeiro que o comerciante Sérvulo
de Patim possui:
Sérvulo de Patim entrou na agência bancária para depositar dez contos de
réis, parte em notas de Cabo Verde, parte em dólares. Felisberto ficou
indeciso com o dinheiro americano. O Sr. Silva advertiu-o que só o
B.N.U. podia comprar e vender divisas, e agora aparecia alguém portador
de moeda estrangeira que não havia regressado de parte alguma. (SOUSA,
1992, p. 137).
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