I Anais do Simpósio de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa - SILALP - page 28

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confere um caráter crítico, assim, “Da mesma maneira, é pela ótica do riso que se colocam
as questões políticas sociais.” (LIMA, 2007, p.171). O trecho a seguir exemplifica esta
questão:
[...] especialmente pelo facto de ninguém já saber quem é quem na
balbúrdia do processo político. Com efeito, ele Napumoceno estava
assistindo a debandada de convictos e influentes membros da União
Nacional para as forças do PAIGC e ficava especialmente confuso ao ver
os homens que gritavam ontem que Portugal é um todo do Minho a
Timor, gritarem hoje com mais força ainda que a independência é um
direito dos povos, não ao referendo, não a federação, não a outros
partidos, só PAIGC é força, luz e guia do nosso povo. Não obstante ter
tido como princípio de vida que nenhum homem tem o direito de se
declarar neutro, sentiu-se dessa vez que tinha dificuldades em tomar
posição, especialmente pela ausência de uma completa informação sobre
o que se passava [...] (ALMEIDA, 1996, p.48-49)
O conturbado processo de independência de Cabo Verde trouxe uma confusão de
diversas esferas no país. Com ironia, o autor de
OTSN
explora os paradoxos do âmbito
político, como verificado no trecho anterior. É possível identificar a ironia na frase,
‘especialmente pelo facto de ninguém já saber quem é quem na balbúrdia do processo
político’(ALMEIDA, 1996, p.48), denunciando os equívocos e desconhecimentos de
declarados ativistas políticos. Esta é uma das situações inerentes no livro que recorre ao
’jogo de desmascaramento’, cujo principal protagonista é o próprio Napumoceno, quem
será, ao longo da narrativa, desmascarado pelo leitor.
Na sequência, se apresenta outro trecho que revela também uma reflexão no campo
político:
[...] na noite de Natal de 1961 dois indivíduos foram presos por terem sido
encontrados na rua já bêbados a gritar viva Neru. Estiveram
incomunicáveis durante mais de quarenta dias, eles a quererem saber por
que tinham sido presos, ninguém sabia responder, eram presos políticos,
presos da pide, eles sem entender por que eram presos políticos etc., até
que foram levados à pide, perguntaram-lhes o que sabiam de Neru, eles
não sabiam quem era Neru, perguntaram-lhes por que então estavam a dar
viva Neru na noite de Natal e não lhes foi fácil explicar que davam viva
peru e não Neru. (ALMEIDA, 1996, p.37)
Nesta passagem, apesar de ter por resultado provavelmente o riso, há uma crítica à
PIDE (Polícia Internacional e de defesa do Estado) e seus procedimentos na época em que
Cabo Verde ainda era colônia de Portugal. O trecho é datado de 1961, reforçando o
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