28
momento histórico que o país vivia. A PIDE existiu entre 1945 a 1969 e era conhecida
como polícia política. Uma de suas principais atividades era o de neutralizar movimentos
de oposição ao Estado Novo de Portugal, assim, quem se opunha era perseguido e
severamente repreendido pela Polícia Internacional. Ela era temida pelos seus métodos de
tortura e alguns crimes sangrentos. Como parte do processo de independência de Cabo
Verde frente à Portugal, as perseguições, algumas vezes gratuita da PIDE, formaram um
momento de lutas pela libertação do país, se configurando num representativo período para
a história cabo-verdiana. Germano Almeida consegue então, como se percebe no trecho
selecionado, abordar este tipo de questão com humor conservando sua postura crítica frente
ao ocorrido.
A participação da personagem principal de
OTSN
na política é, por diversas vezes
explorada como ferramenta para denúncias e reflexões. No entanto, o autor conserva-se
isento de posturas radicais panfletárias ou assumidamente partidárias, criticando o conjunto
como um todo. Um destes momentos do romance é possível se verificar no exemplo a
seguir:
Porém, na campanha eleitoral para vereação, quando se ficou conhecer a
sua ação junto do presidente da Câmara quando da tragédia das cheias e
do mais que ele fez e até da sua deslocação à Boa Vista com o proposto
exclusivo de arranjar cal par reconstruir as casas dos pobres apanhados
pela cheia, uma aureola de homem sensível aos problemas da pobreza
começou a rodear o Sr. Napumoceno. Evidentemente que ele desmentia
essa ação, era apenas um pobre comerciante que ajudava no que podia,
devia-se isso sim e muito, ao Sr. Presidente da Câmara, ele não passava de
um simples vereador que apenas aconselhava com a sua experiência e
conhecimento que tinha da pobreza , claro que a idéia do cal parecera-lhe
boa por ser mais barato...(ALMEIDA, 1996, p. 76)
O discurso de falsa humildade que Napumoceno faz ao final desta passagem apenas
contribui para reforçar a hipocrisia de suas palavras, visto que o leitor acompanha e
desmascara, pela perspectiva do narrador, as reais atitudes e intenções da personagem
central. Este narrador, que sempre se apresenta sob diversas vozes, ora heterodiegético, ora
homodiegético e às vezes ainda autodiegético, antes de assumir a voz de primeira pessoa,
narra as verdadeiras ações do protagonista, e acrescenta ao final um juízo de valor ao
comentar ‘claro que a ideia do cal parecera-lhe boa por ser mais barato...’(ALMEIDA,
1996, p.76). Com este desfecho o que se desconfiava fica evidente, e se confirma a falsa
humildade do discurso de Napumoceno, além, é claro, da hipocrisia de sua atitude.