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responsável pela atitude de represália fora Edmundo Barata dos Reis – o então agente da
segurança de Estado.
Depois de sair de Angola (como exilado político), retorna – constrói uma nova
vida, sendo re-batizado por Félix – com o intuito de vingar-se do homem que matara
sua esposa, e sua filha (a qual não sabia que estava viva; e a reencontra neste seu
repatriamento como angolano).
No entanto, quem mata Edmundo é Ângela Lúcia, a filha de Pedro Gouveia.
Numa criação de opostos, de reflexos contraditórios, pai e filha se configuram
enquanto sombra e luz, respectivamente. Ângela Lúcia (anjo de luz) é também
fotógrafa, como Pedro; só que diferente deste – que é um fotógrafo de guerra, da
escuridão da guerra –, Ângela Lúcia fotografa luz, é uma “colecionadora de luz”.
“Mesmo nos céus mais improváveis, Ângela Lúcia descobrira brilhos a merecerem ser
salvos do esquecimento” (
V.P.
, 2007, p.63).
A fotógrafa viajara o mundo. Ela se deslocou por vários espaços, espaços estes
fluidos, “o não-território”. Segundo Stella Montalvão (2011, p.89), Ângela Lúcia
“escapa do processo de des-re-territorialização”. Diferentemente de Félix e Eulálio (o
narrador), que estão “exilados” em casa, ela não se prende a um lugar fixo;
diferentemente de seu próprio pai, Pedro Gouveia, que tendo que sair do país se
desterritorializa, para depois – ao voltar a Angola – se reterritorializar, com um novo
nome, Ângela é angolana (filha de uma angolana e de um português; habita este
entrelugar da hibridação/mestiçagem), mas uma angolana que se constrói em contato
com o mundo. Ela não precisou perder um passado para recriar uma nova história; ela
simplesmente vive no movimento.
Agualusa faz deste romance um meio de repensar, além das considerações
acerca da identidade, alguns aspectos da História de Angola, país este marcado por
guerras, e pelo desafio de firmar e construir uma identidade nacional, aceitando as
diferenças
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, dentro deste tempo caracterizado pela globalização e pós-modernidade,
“fenômenos de alcance político, social, econômico e cultural” (MONTALVÃO, 2011,
p.80).
A dificuldade torna-se mais evidente por se tratar de uma ex-colônia
portuguesa
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que nem sequer participou diretamente dos processos de modernização, e
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Como realça Stella Montalvão (2011, p.80) ao recorrer a Inocência Mata.
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Portugal, como enfatiza Boaventura de Sousa Santos (2006), é um próspero calibanizado; é o sul do
norte. Portugal se encontra à margem dos poderosos países europeus; é um país que também fora