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ao lado de quem já detêm a autoridade e a legitimidade. Quando se
está numa guerra, a omissão sempre favorece o dominante.
Aprofundar essas inquietações tão presentes nas relações sociais entre brancos
e negros, ao mesmo tempo em que nos torna mais cônscios do nosso papel como
cidadão, fortalece nossa responsabilidade diante de atitudes racistas e preconceituosas
que circundam a sociedade contemporânea através das infindáveis máscaras da
prepotência. Temos em mente que o homem, independente de sua cor ou posição social,
precisa do olhar do outro para conhecer a si mesmo e, através dessa cumplicidade,
admitir a necessidade deste como referencial de sua existência. Nas palavras de Nelson
Mandela, o grande líder africano:
“Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou
ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender; e se podem aprender a
odiar podem ser ensinadas a amar” (MANDELA, 1995, p. 28).
Com certeza, essa forma especial de olhar o próximo, irá compor a sintonia
precisa, capaz de nos tornar mais próximos e sensíveis diante dos outros e das dores que
significam sua própria existência. Tal atitude, de olhar o próximo e de nele perceber a
sua própria existência se configura como um exercício de
sair de sua própria ilha
e
rever seus conceitos, a partir do entendimento do próximo. Saramago, em seu livro O
Conto da Ilha Desconhecida, dizia “que é preciso sair da ilha para ver a ilha, que não
nos vemos se não nos saímos de nós” (2010, p. 41).
Com certeza, as sábias palavras de Saramago servem para fortalecer a ideia de
que somente podemos encontrar as respostas para os problemas e inquietudes da vida,
quando nos permitimos sair do egoísmo e do antropocentrismo que nos acomoda e nos
cega ante às dores do mundo.
Essa alteridade, quando for introjetada a nossa ação cotidiana, irá contribuir
para a construção de uma sociedade mais humanizada e, socialmente, mais justa. Esse
novo olhar, amplamente divulgado e tão cultuado nas leituras bakhtinianas, irá nos
proporcionar uma visão isotópica por demais significativa onde o homem, desarmado
de seus pré-conceitos, será capaz de abandonar a condição de espectador de uma
história, para tornar-se parte indissociável de seu enredo. É justamente esse olhar
dialógico que pretendemos desenvolver ao longo desse trabalho a partir dos relatos
sobre o escravismo no Brasil e, paralelamente, aprofundar algumas reflexões
conceituais que tendem a perpetuar a supremacia do branco em relação ao negro.