Zélia Lopes da Silva (Org.)
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porque, conforme vai passando o tempo, as coisas vão se renovando. Alguma coisa do
passado vai ficando, tem que renovar. Ah, eu não sei, eu gosto daqui. Olha, sinceramente,
um dia eu vou ter que sair daqui; esse dia vai chegar mas eu...
Entrevistadoras:
Não tão cedo.
— V.R.C.S.
: Não, eu não quero ver essa hora chegar. Não quero mesmo porque eu gosto
daqui. E não é só eu não, todo mundo que entra aqui não tem coragem de sair.
Entrevistadoras:
É geral assim?
— V.R.C.S.
: É geral.
Entrevistadoras:
Fale um pouco da sua vida. Você sempre morou aqui em Assis?
— V.R.C.S.
: Então, eu morei aqui em Assis desde quando eu nasci. Faz 53 anos que eu
moro aqui. E dentro desses 53 anos, eu trabalhei [sempre]. Na verdade, eu não tive a
minha infância. Eu morava num asilo. Morava num asilo junto com a irmã Eugênia. Eu
estava com 7, 8 anos de idade. Minha mãe tinha que trabalhar e não tinha onde deixar a
gente. Não existia creche naquela época. Daí, eu fui morar com os velhinhos no asilo. Daí
eu morei lá até os 13 anos mais ou menos, se não me falha a memória. Daí, eu comecei a
morar com famílias que iam visitar o asilo. Eu morei um tempo com a Dona Pimpa. Depois
da Dona Pimpa, eu morei com a família Silva, morei com eles. Depois quando eu tinha uns
15 anos, eu fui morar com a minha mãe. Daí eu fui trabalhar como bóia-fria para ajudar
ela, porque a gente queria comprar um lote. Daí, eu comecei a trabalhar como bóia-fria.
Eu carpia café, carpia soja, colhia algodão, colhia café. Quando eu tinha 20 anos, eu parei
de estudar.
Entrevistadoras:
Então você chegou a terminar o terceiro colegial?
— V.R.C.S.
: Lá fora eu terminei o terceiro, antes de entrar aqui. Mas tudo em supletivo.
Porque, às vezes, quando eu ia uma semana na escola a outra semana já não dava para
ir porque eu não batia horário de serviço. Daí, quando eu estava com 21 anos, eu entrei
numa casa de família para trabalhar. Maria Nunes, hoje ela é minha comadre. Eu trabalhei
lá muito tempo. Não lembro quanto tempo foi eu sei que foi muito tempo. Depois, eu
casei lá. Eu acho que trabalhei lá uns 20 anos mais ou menos. De lá é que eu entrei na
Prefeitura. Depois da Prefeitura eu vim para a Cooperativa.
Entrevistadoras:
Então, sua infância foi só trabalho e estudo?
— V.R.C.S.
: Só trabalho.
Entrevistadoras:
Brincadeira e convívio com as outras crianças como foi?
— V.R.C.S.
: Nunca tive. É o que eu falo, eu não tive infância e hoje em si eu vejo essas
crianças que as mães vão trabalhar e não tem lugar para deixar as crianças. Porque
sábado, não funciona a creche, não funciona nada, né. Eu estava pensando em fazer um
projeto para Cooperativa, para ficar com essas crianças no sábado, feriado. Hoje é feriado,
tem criança que veio para cá junto com a mãe. Isso daí não pode. É risco para uma criança
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