Memória dos Catadores de Materiais Recicláveis de Assis (2001-2007)
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os meus professores eles explicavam, mas não tão bem explicado como era para outra
minha amiga que estava do meu lado.
Entrevistadoras:
Então, os próprios professores tinham um tratamento diferente?
— V.R.C.S.
: Tinham uma diferença, mas era uma diferença que não deixava transparecer,
entendeu?! Mas você que está ali, você sente que não era igual. Até que lá deu para eu
superar, mas dentro da Cooperativa foi pior. Eu não sei, eu acho que a minha vida é passar
obstáculo, porque não é possível (risos). Porque acontece cada coisa comigo que eu fico
besta. Olha, aqui dentro era assim. Ela é metida. Ela quer ser o que não é. Ela pensa que
só ela que sabe falar. Ela pensa que só ela sabe fazer, sabe?!
Entrevistadoras:
Pelo fato de você estar estudando?
— V.R.C.S.
: Pelo fato de eu fazer a faculdade. Então, eu fui muito recriminada aqui mesmo,
só que ninguém percebe isso. Eu tentava falar para alguém. Você grita e ninguém te
escuta? Eu estava gritando e ninguém estava me escutando, eu tentando passar alguma
coisa e ninguém me ouvia. Até então, eu larguei para lá, deixei, não quis nem saber. O meu
objetivo é fazer a minha faculdade seja ela do jeito que for, mas eu vou fazer. Daí, quando
eu estava quase no fim, eu falei que ia sair da faculdade. Eles falaram, não, você não vai
desistir. Mas só que o diretor, o dono da faculdade que é o filho da Dona Cida Mucke, não
sei se vocês já ouviram falar nela aqui emAssis. Nossa! Ele era uma pessoa excelente, ele
entendia o meu lado. Ele era uma pessoa que chegava e vinha conversar comigo. Como
foi o meu serviço, como está a coleta seletiva. Então, ele me deu aquela força, porque se
fosse pelos outros eu tinha desistido, viu?! Porque as barra foi forte.
Entrevistadoras:
Os outros também discriminavam?
— V.R.C.S.
: Eram poucos. Alunos, um pouco sim um pouco não. Mas aqui foi muito pior
para mim. Às vezes, eu falo, isso que vocês fizeram comigo é bullying, né. Eles falam: que
bullying nada, que não sei que tem, né. Ele não é recriminado aqui dentro, numa reunião
de comitê, num encontro de catadores; se eu for falar com um ministro da Educação, um
ministro lá das quanta, algum ministro eu já vou me indicando que eu sou catadora. Então,
os catadores estão tão na mídia que ninguém recrimina, “Nossa, é catadores, então eu
vou receber”. Você está entendendo?! Agora se eu for sem falar que eu sou catadora e
sendo catadora, ah minha filha, você leva pau mesmo. Porque muitas vezes eu ficava
quieta, eu não falava que eu trabalhava aqui pra ver a reação, né. Para mim ver o que que
eles falavam. [Alguns diziam]: “Aquele serviço lá é muito nojento, eu não sei como que as
pessoas aguentam trabalhar lá”. Eu falava “É, mas só que eu sou uma catadora, eu trabalho
lá e não é nada disso que vocês pensam, entendeu?!” Então é muito complicado. Eu sofri
mesmo só que hoje ninguém perguntou pra mim: “O Vilma, você fez a faculdade, como
você foi recebida?”. Hoje, eu não vejo ninguém daqui vir perguntar isso pra mim. Você está
entendendo? Eles perguntam: “Nossa Vilma, você fez uma faculdade, você vai ficar aqui.
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