Memória dos Catadores de Materiais Recicláveis de Assis (2001-2007)
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das coisas, eu não gosto de falar no vazio. Foi indo, aí ia perguntando para Ana Maria
porque eu tenho muito intimidade assim de conversar sobre o projeto, sobre a Cooperativa
com o professor Carlos Ladeia. Eu chegava professor, o que é isso? Ele sentava, ele
explicava. Então, nisso daí, eu fui me envolvendo na Cooperativa, eu fui pegando gosto.
Daí eu já comecei fazer e entrei de coordenadora de limpeza; de coordenadora de limpeza
eu já fui para coordenadora de turma aqui dentro. Era tudo aqui, não tinha coleta seletiva
na época, ainda; isso era tudo aqui dentro. Daí tinha projeto e tinha gente que nem sabia
lê, que nem sabia escrever e a Ana Maria pedia para a turma ir para o Mobral. E vai, a
Cooperativa está fazendo projeto dentro dela. Eu estou vendo a coisa andar. Eu falei “Meu
Deus esse negócio é sério”. Eu vou me envolver nisso. Comecei a me se interessar. Daí
eu já não trabalhava mais pelo dinheiro, só para mim. Daí, já queria participar (Não vai
jogar esse material fora que isso é dinheiro. Eu já comecei catar já comecei a passar nos
amigos). Então, foi essa evolução que eu tive na minha cabeça que abriu meu QI. Bom, tá
tudo bem né, depois eu falei assim: “Mas como que a gente vai sair desse lixo? Tem que ter
alguma coisa para sair do lixo”. E nesse intervalo veio a Ana Maria e o Carlos com o projeto
de coleta seletiva. Eles conversaram com a gente, que são os mais velhos que estavam
aqui. Falei, nossa, isso daí é muito bom, né. A gente na rua pega o material limpinho, né.
Eu comecei a imaginar né, a gente lá e tal. Daí quando foi um belo dia surgiu o projeto, foi
trabalhado como antes, capacitação, como mexer, como conversar com a dona de casa,
que o catador não era mendigo. Era gente civilizada, que tinha que saber conversar. Nesse
intervalo que entrou a coleta seletiva na rua veio o Mova Brasil aqui dentro que são aulas
populares. Nessa aula popular, a gente vinha de manhã e a gente ia para a escolinha. A
gente quando era sete e meia a gente tomava café na escolinha quando era oito e meia
a gente ia para a rua que a gente tinha que ter uma aula que era um projeto que veio lá
de São Paulo. Lá do comitê estadual esse projeto era de catador para catador, mas como
não tinha nenhum catador que sabia fazer alguma coisa, então, veio (que nem aqui em
Assis), um estagiário da Unesp e um catador junto, para ir pegando o gosto da coisa, para
vê como que era, né. Eu sentei naquela mesinha lá e eu comecei me relembrar. Eu falei
“Poxa, bem que eu poderia estudar, né”; “Bem que eu poderia fazer alguma coisa para me
ajudar e a meus companheiros porque aqui vai precisar um dia”. Eu pensei, mas não dei
bola, depois eu comecei amadurecer essa ideia, e eu fui observando que a voz do catador
para catador é diferente. E daí eu resolvi fazer um vestibular.
Entrevistadoras:
Como foi esse vestibular?
— V.R.C.S.
: Eu fui à UNIP. Fiz vestibular, mas eu tinha que pagar uma taxa para entrar,
né. E eu não tinha dinheiro para pagar matrícula. Eu falei assim, mas nem por isso eu vou
deixa de estudar. Comecei a pensar. Quer saber de uma coisa eu vou fazer uma rifa. Do
quê? Peguei, fiz uma rifa de cinco litros de gasolina ou de álcool, mas daí eu já tirei da
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