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possível, de acordo com o historiador, descobrir uma
zona de realidade não visível,
(FERRO, 1988, p. 207).
Morettin (2003, p. 15) também questiona a validade destes elementos, considerados
por ele como dicotômicos (
aparente-latente
,
visível-invisível, história-contra-história
), para
analisar as relações entre cinema e história. Este tipo de produção possui tensões próprias,
que não podem ser pensadas como dualidades, por oposição. As imagens apresentam
nuances diversas e, além disso, ao se considerar dois níveis de significado independentes,
corre-se o risco de perder de vista seu caráter polissêmico. Contudo, apesar desta
polissemia, não se pode afirmar que seja possível apreender todas as significações contidas
em um filme. É possível identificar sentidos e significados diferenciados, considerando os
aspectos ideológicos de quem assiste, como afirma Pierre Sorlin em
Sociologie du cinéma
(SORLIN, 1977). Em síntese, o olhar é guiado por uma ideologia,
anterior
ao olhar.
Mesmo em face das observações e questionamentos apresentados por Morettin, não
se pode negar a importância da contribuição de Ferro para os estudos sobre este tipo de
produção, conquanto o debate historiográfico tenha se modificado desde a época da
publicação. Ao expor estas questões, reafirma-se a importância do cinema como produção
cultural e sua relevância como fonte para a pesquisa histórica, sem perder de vista suas
especificidades.
Embora a produção fílmica seja a representação de um aspecto da realidade, com
imagens editadas para compor a narrativa pensada pelo diretor, Ferro reitera que, mesmo
involuntariamente, aspectos da realidade e da temporalidade da produção fílmica aparecem.
Eles podem ser percebidos, por exemplo, por meio dos gestos e do modo de falar dos
atores, pela maneira de construir a narrativa da obra, ou por meio da montagem e edição
das imagens, efeitos especiais, sonoplastia, trilha sonora e outros elementos inerentes a
este tipo de produção. A própria escolha do tema e a sua maneira de abordá-lo carregam
em si uma temporalidade, no caso, sobre as questões que são importantes (ou relevantes)
para um grupo social, em um período determinado. Assim, temas que podem ser pertinentes
numa determinada época, podem deixar de ser em outra. Além do mais, se for um filme que
retrate uma outra época, diferentes temporalidades coexistem: a do filme e aquela descrita
pelo seu enredo.
Marc Ferro viu no cinema novas possibilidades de pesquisa, Pierre Sorlin, por sua
vez, esboçou um método de análise em que “as obras audiovisuais são os reflexos de
representações da realidade do meio cultural que os produz” (SORLIN apud SOULET, 2009,
p. 182)
.
Baseado no conceito de ideologia, definida por Sorlin como um “conjunto de
explicações, de crenças e de valores aceitos e empregados numa formação social”, o autor
destaca a noção de
sistema de representação.
Por meio dele é que uma ideologia toma
forma e permite que um filme seja visto como “expressão ideológica particular”. Contudo,