Anais do VII Encontro do Cedap – Culturas indígenas e identidades - page 267

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Sem adotar uma postura única, Veríssimo possui um
senso de relatividade
, que faz
sua atividade crítica ser norteada por uma infinidade de princípios estéticos e filosóficos que
aparentemente sugerem uma ideia de livre-pensador, conforme Moisés Velinho ou Afrânio
Coutinho, que na mesma direção considera que tal senso de relatividade é limitado ao
processo de formação do campo intelectual proposto pelo crítico.
Um processo de “antropofagia” toma conta do crítico literário ao traçar o percurso
histórico da literatura brasileira por intermédio daquelas obras mais representativas para
determinado público-leitor.
No caso de José Veríssimo, o “processo antropofágico” se faz presente na releitura
de teóricos, matrizes e modelos europeus que ganham uma nova abordagem por parte do
crítico, pois, de certa forma, são aclimatados ao ambiente brasileiro. Apesar da vinculação
ao método de Taine e seus discípulos, Schrerer na Alemanha, Brandes na Dinamarca e
Brunetière na França, o crítico paraense consolida suas ideias valendo-se da configuração
de uma
História da literatura brasileira
que considera o “natural” desenvolvimento da
cultura, vinculado a um aprimoramento estético, formado por ideias e conceitos muitas
vezes contraditórios, moldados pela revisão de sua própria obra, de seus conceitos e,
principalmente, de um horizonte de leituras extremamente abrangente.
O resultado é a definição de um cânone literário interligado ao desenvolvimento de
uma consciência nacional e à recuperação de uma cultura de fundo “iluminista”, que corre o
risco de ser esquecida pela mudança das estruturas sociais.
A tarefa de Veríssimo, dessa forma, não é apenas de acompanhar através dos
tempos o percurso de um objeto chamado literatura, com base em uma definição comum
para todas as épocas, “literatura como arte literária” segundo Veríssimo. É também
preservar uma seleção de obras que “evoluem” para a representação de uma autonomia
entendida como o rompimento dos vínculos com a metrópole e, consequentemente, a
concepção de uma identidade própria para a cultura brasileira. Essa identidade, por sua vez,
estaria atrelada aos princípios da crítica de Brunetière – julgamento, classificação e
explicação – cujo modelo literário, voltado para a tradição francesa, valoriza os ideais morais
e clássicos do passado por meio de posições-chave para o crítico: editor-chefe na
Revue
des Deux Mondes,
professor da École Normale e membro da Academia Francesa.
Brunetière desenvolve uma visão pragmática da crítica e da história literária cujo
papel deveria focalizar as obras literárias em si mesmas. Veríssimo utiliza-se dos três
conceitos de Brunetière ao estabelecer que o julgamento deve isentar-se de qualquer
preferência pessoal, impressão ou prazer subjetivo. Para o crítico francês, a crítica não
deveria ser formada por uma rígida estrutura sistemática porque correria o risco de tornar-se
um ramo do conhecimento social, mas ter um arcabouço teórico que sustentasse
concepções literárias e artísticas. Outra lição de Brunetière, resgatada por Veríssimo, se
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