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O efeito desse trabalho será a reconstituição do passado intelectual brasileiro por
meio da formação de uma “genealogia” do pensamento literário nacional. O século XIX,
marcado por grandes mudanças políticas e sociais que visam inserir o país na modernidade
ocidental, desde 1808, com a chegada de D. João VI ao Brasil, inicia um processo de
institucionalização da cultura e da política brasileira que redimensiona a esfera pública
nacional e impõe, a partir da Independência (1822), novos rumos para a cultura brasileira.
Como exemplo tem-se a posição de Ferdinand Denis, e muitos outros historiadores
românticos, que, associando historicismo e nacionalismo, fundam um sentido retrospectivo
para a análise dos escritores brasileiros, aliando ao nacional, originalidade e cor local.
Mediante essa conciliação, o Brasil inicia uma tradição que, até o início do século XX,
vincula literatura brasileira à expressão da nacionalidade e desenvolvimento da sociedade.
O papel dos escritores românticos, ao reconstituir o passado nacional por intermédio
de genealogias intelectuais, é iniciar uma organização intelectual. Isso os transformará em
críticos-historiadores, preocupados com o desenvolvimento da consciência da cultura feita
no Brasil, por meio da efervescência dos ideais românticos, das concepções que legitimam
o solo nativo e do sentimento nacional como forma de originalidade e afirmação da
nacionalidade.
A sistematização da literatura é feita com base no ponto de vista cronológico,
comprovando o enlace entre compromisso estético e cor local ao se estabelecer relações
entre a formação da literatura nacional e o desenvolvimento do Brasil. Tendo seu ápice na
Independência, os intelectuais da época identificam-se com os grupos nativos – daí o
indianismo – produzindo uma literatura relacionada com o mundo tropical.
Por meio dos bosquejos, esboços, parnasos e florilégios surge, com o Romantismo,
a sistematização cronológica da literatura brasileira alicerçada na biobibliografia dos
escritores mais representativos do Brasil. Ao longo do Segundo Reinado (1840-1889),
algumas instituições, como os Institutos Históricos e Academias, são encarregadas de
elaborar um novo conceito de nação. Os escritores românticos, por meio de imagens
brasileiras – como o índio, o passado heróico, a natureza – em conformidade com os
críticos, que misturavam história e literatura na construção de um imaginário nacional, criam
um discurso local apoiado em valores metropolitanos e tidos como universais.
Após trezentos anos de colonização, o Brasil organiza um discurso, alicerçado na
reordenação de um campo intelectual voltado para ideais de liberdade e originalidade, e,
principalmente, de progressivo distanciamento dos modelos e valores portugueses.
Estimulando a incipiente literatura nacional e promovendo o registro das letras no
Brasil, os críticos românticos orientam o gosto literário dos leitores e ditam as regras para os
jovens escritores, ao formar e delimitar o patrimônio literário que será objeto de estudo dos
críticos naturalistas. Na
História da literatura brasileira
,
de José Veríssimo, por exemplo,