Anais do VII Encontro do Cedap – Culturas indígenas e identidades - page 250

248 
acadêmica sugeria é o “Fundamento Histórico”, texto que serve de acompanhamento ao
poema épico intitulado “Vila Rica” e que seria publicado apenas em 1839, postumamente,
portanto.
Apesar do “Fundamento Histórico” servir de pano de fundo histórico ao poema “Vila
Rica”, sua composição, de certo modo, demonstra pesquisa prévia, algo que demandaria
excessivo trabalho para um texto de apoio. Cláudio Manuel da Costa, no entanto, no
primeiro parágrafo do “Fundamento Histórico” justifica o fato de as notas explicativas não ser
o suficiente para o esclarecimento dos versos de seu poema, de modo que resolveu
escrever a “notícia” do descobrimento de Minas Gerais:
Persuadido o autor desta obra de que não serão bastantes as notas com
que ilustrou os seus Cantos a instruir ao Leitor da notícia mais completa do
descobrimento das Minas Gerais, da sua povoação e do aumento a que têm
chegado os seus pequenos Arraiais, se resolveu a escrever esta
preliminação histórica, em que protesta não pertender alterar a verdade a
benefício de alguma paixão, e só se regula pelo mais crítico e incontestável
exame, que por si e por pessoas de conhecida inteligência e probidade
pôde conseguir sobre fatos que ou a tradição conserva de memória, ou
escreveu raramente algum gênio curioso, que o testemunhou de vista.
(COSTA, 1996, p. 360).
Essa introdução permite considerar a ideia de que o documento tenha sido escrito
com finalidade secundária, ou seja, apenas como um pano de fundo para a leitura do poema
(a mais importante, portanto). O fim do documento não é contestável. Cláudio Manuel da
Costa o afirma. Todavia, como se revelou ao longo deste trabalho, a reunião da
documentação necessária à escrita da dissertação deu-se ainda quando o autor era
secretário de governo, época também em que era filiado à Academia Brasílica dos
Renascidos. Assim, o principal fator que se propõe a investigar é a intenção de tal escrito.
No fragmento em destaque, o autor afirma não pretender “alterar a verdade a
benefício de alguma paixão”, pressuposto também encontrado nas práticas acadêmicas
ilustradas. Assim, o tratamento conferido à retórica previa a utilização de documentos
escritos para comprovação das afirmações. O autor, no entanto, não exclui de suas
investigações as contribuições “que a tradição conserva de memória” e é nesse ponto que a
ficção pode se revelar.
Antonio Cândido, no prefácio de
Raízes do Brasil
de Sérgio Buarque de Holanda
(2001, p. 9), salienta que, a certo momento da vida, nossos testemunhos tornam-se
registros da experiência de muitos, de uma geração. Julgando-se diferentes, vão tornando-
se tão iguais, que acabam desaparecendo em sua individualidade para se dissolverem nas
características gerais de sua época. Assim, “registrar o passado não é falar de si; é falar dos
que participaram de certa ordem de interesses e de visão do mundo, no momento particular
do tempo que se deseja evocar”.
1...,240,241,242,243,244,245,246,247,248,249 251,252,253,254,255,256,257,258,259,260,...328
Powered by FlippingBook