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Nessa seara, comunistas, liberais anticristãos, desocupados e toda atitude que causasse
algum dano à moral e aos costumes, estavam inclusos (CANCELLI, 1993, p. 21, 26).
Em relação aos desocupados, à “massa dos sem-trabalho”, o chefe policial Filinto
Muller demonstrou “temor” em relação ao perigo que este “contingente” poderia representar
ao espaço urbano. Elizabeth Cancelli atenta para os campos percorridos pelas incursões
policiais:
O controle da malandragem, a vigilância das ruas com suas centenas de
informantes anônimos e em potencial, a forte e ferrenha censura, o
policiamento ostensivo das praias, o controle e tutela policiais das festas
populares, como o carnaval, e a exaltação ao cidadão pacato, à família
também faziam parte do cotidiano policial. (CANCELLI, 1993, p. 33).
Da fundação do Estado Novo, em novembro de 1937, até o seu término, em 1945,
todos os atores do sistema político eram alvos de um discurso político-ideológico espraiado
pelo Departamento de Imprensa e Propaganda, em que a construção de uma democracia
social estava voltada às relações sociais, privilegiando formas de organização universais de
todas as classes:
A relação direta homem/poder público é assim qualificada pelo trabalho
como uma relação cidadão/Estado. Desta dinâmica adviria o sentido social
profundo da fórmula política encontrada pelo Estado Novo. O cidadão desta
nova democracia, identificado por seu trabalho produtivo, não mais se
definiria pela posse de direito civis e políticos, mas justamente pela posse
de direitos sociais. [...] Pelo trabalho o cidadão encontraria sua posição na
sociedade e estabeleceria relações com o Estado; por esta mesma razão, o
Estado se humanizaria, destinando-se a assegurar a realização plena dos
cidadãos pela via de promoção da justiça social. (GOMES, 1992, p. 110,
127).
Combatendo o regionalismo, o individualismo e as atuações partidárias
“anarquizantes”, a ditadura do Estado Novo propagandeava “uma comunidade nacional”
harmoniosa que necessitaria apenas de um Estado forte para atingir o crescimento social e
econômico.
Essa política ostensiva de unificação nacional já tinha um território e personagens
conhecidos nos anos anteriores ao projeto “estadonovista”. Alguns periódicos, entre eles o
Correio da Manhã
, consideram o carnaval, já na década de 1930, um “cartão postal” do
Brasil, pois era capaz de arregimentar todas as classes sociais que, juntas, dançavam e
cantavam em uníssono as maravilhas do país. Ao Estado Novo coube a verticalização
desse projeto, com outros interesses que não o turístico ou financeiro (BEZERRA, 2012)
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Na introdução e no primeiro capítulo da dissertação, encontram-se detalhados os projetos que envolviam os carnavais do Rio
de Janeiro em torno de sua oficialização e projeção nacional.