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“INDÍGENAS” NOS CARNAVAIS DE RUA DO RIO DE JANEIRO (1939 E 1964)
Danilo Alves BEZERRA
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Os carnavais brincados no Rio de Janeiro durante o século XX ocorreram em
espaços múltiplos, tais como: ruas, avenidas, salões, praias etc. Esses locais, com
especificidades e foliões diversos, garantiram um rol de formas para homenagear Momo.
Entre esses espaços, as ruas configuraram-se como locais privilegiados para que certas
regras e tabus, que permeavam o cotidiano, fossem golpeados. Assim, foliões vestidos de
indígenas e capturados pelas objetivas de periódicos como a revista
O Cruzeiro,
em 1939
e
o jornal
Correio da Manhã
, em 1964 não só desnudavam seus corpos em homenagem aos
primeiros habitantes do Brasil, como também quebravam com a sisudez cotidiana ao
percorrerem as ruas e avenidas cariocas nessas fantasias. Os sentidos que o fantasiar-se
(de indígena) abrange, bem como as particularidades e a cobertura jornalística em torno
desses carnavais serão o objetivo dessas reflexões.
Diabos, princesas, marinheiros, odaliscas, velhos, bruxas, bebês, baianas e
malandros; o rol de fantasias que o folião carioca possuía não é possível de ser descrito
nessas poucas linhas. Para brincar os dias de Momo, a criatividade ganhava os amplos
salões, as ruas (do centro e dos bairros), as praias e as largas avenidas do Rio de Janeiro
do século passado.
Fantasiar-se, contudo, é uma ação que está sujeita a uma série de questões –
muitas delas inconscientes – e escolher o que vestir e a quem homenagear no carnaval,
para muitos não era tarefa fácil. Escolher “ser príncipe” ou “malandro” durante o carnaval
não estava, para muitos, no âmbito da opção. Uma fantasia, dependendo de sua
peculiaridade – tecidos, ornamentos, joias – e popularidade – baiana, odalisca – custava
muito mais do que os foliões comuns poderiam pagar. A solução, para muitos, estava na
escolha de fantasias simples, de fácil acesso e confecção. Entre as possibilidades mais
populares – diabos, marinheiros, por exemplo – a fantasia de indígena era uma escolha
financeiramente viável, confortável para o verão carioca e que permitia ao folião desnudar-
se, ainda que parcialmente, durante os dias de festa.
Pautado num cotidiano em que as interdições ao corpo eram muitas, vestir-se de
indígena e dar vazão aos desejos reprimidos era, certamente, uma das motivações que
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Doutorando – Programa de Pós-Graduação em História – Faculdade de Ciências e Letras de Assis – Unesp – Univ. Estadual
Paulista, Campus de Assis – Av. Dom Antonio, 2100, CEP: 19806-900, Assis, São Paulo – Brasil. Bolsista CAPES. E-mail: