Anais do 1º Colóquio Internacional de Texto e Discurso - CITeD - page 238

Acontecimento discursivo nas Ações Afirmativas
Para o estudo dos modos de designar o negro e seus descendentes, tomamos
como acontecimento discursivo o Estatuto da Igualdade Racial, visto ser nele que os
movimentos dos sentidos começam a trabalhar. Para tanto, vale aqui uma discussão
sobre o acontecimento histórico e o discursivo.
Segundo Le Goff (1990), “O acontecimento histórico consiste em um fato que,
por sua relevância enquanto ocorrência no mundo, passa a ser rememorado na história,
fazendo parte do dizer sobre o passado de um povo, narrado pela ciência histórica.”
Segundo o autor, podemos considerar as ações afirmativas como um acontecimento
histórico na sociedade brasileira, visto rememorar um passado acerca da constituição
racial, do preconceito e da inferiorização dos negros e seus descendentes por outros
sujeitos desta sociedade. Assim, temos todo um saber acerca desses sujeitos que
ocupam uma posição, um lugar de dizer nessa sociedade. Nota-se que Le Goff assevera
acerca da rememoração dos acontecimentos históricos como, por exemplo, a escravidão,
os processos de miscigenação na sociedade brasileira, entre outros, que fazem parte de
nossa memória de dizeres.
Não obstante, é necessário para nossos objetivos, tendo em vista nossa
abordagem discursiva sobre o corpus, considerar o acontecimento discursivo acerca das
nomeações “negro”, “mulato”, “afrodescendente” e “afro-brasileiro”. Para tanto,
necessitamos compreender que, segundo Pêcheux (2006), o acontecimento discursivo é
o “ponto de encontro de uma atualidade e uma memória”, ou seja, devemos considerar a
atualização dos sentidos de um léxico, considerando o contexto imediato de sua
enunciação, bem como toda uma memória discursiva que carrega os saberes acerca
desse léxico, decorrente de todas as outras enunciações em que ele apareceu.
Na sociedade brasileira, tem-se como pré-construída uma imagem acerca do
negro, decorrente de discursos que circulam sobre a vinda desses sujeitos para o Brasil
na condição de escravos, a fim de trabalharem nas lavouras de cana-de-açúcar. É
corrente, também, toda a condição social a que esses escravos eram submetidos, sendo
até mesmo despossuídos de suas caracterizações de sujeitos – ao serem trazidos para o
Brasil, eram negociados como mercadorias, perdendo seu valor social e humano, sendo
comparados a coisas. Assim, mesmo após o final do período escravocrata, e a libertação
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