situação do país. Assim, nesse acontecimento, os sentidos começam a ser produzidos e
passam a circular, promovendo uma luta ideológica contra a miscigenação. Então, neste
ponto, começa a produzir um efeito de sentido específico o ditado “os mulatos são
perigosos”, ou o silenciamento do escritor Lima Barreto. Obviamente, perigoso era o
fato de haver a miscigenação no país, não podendo mais ser dividido pelas questões
raciais; agora, os mestiços frutos da mistura com os negros e índios começam a sofrer
com a exclusão pretendida pela parcela dita “pura” da sociedade.
Ao enunciar “mulato”, “mestiço”, “pardo”, entre outros modos de designar a
miscigenação racial existente no país, faz-se trabalhar no acontecimento em questão
toda uma memória da presença do outro na sociedade, e de um outro que era tido como
inferior, mas que manteve relações íntimas com os “superiores”, de modo que surgiram
frutos dessa relação.
Evidentemente, a sociedade atual ainda sofre com o preconceito existente, que
circula por meio de discursos aparentemente democráticos, que pretendem a inclusão
das parcelas menos favorecidas da sociedade; no entanto, a presença do diferente, no
tido como inferior no convívio social produz um distanciamento que ocorre por meio
não só das ações, mas discursivamente, promovendo deslocamentos nas posições que
estes sujeitos podem e devem ocupar para que tenham garantido seu direito de dizer.
Tão grave é a exclusão sofrida por esses sujeitos, que seu acesso ao ensino de qualidade
fica prejudicado, visto ocuparem posições na sociedade que apenas lhe garantem acesso
ao ensino público, em que a qualidade não pode ser considerada tão alta. Entretanto, tal
acesso não vai muito além do ensino médio, pois sua aprovação para as universidades
públicas não ocorre, promovendo uma outra exclusão social, o que levou o Estado a
instituir um “discurso igualitário” – o Estatuto da Igualdade Racial.
Para este trabalho, interessa-nos os modos como os negros, mulato e mestiços
fruto da miscigenação entre negros, índios e brancos são designados. Como o Estatuto
estabelece novos modos de dizer esses sujeitos, considerá-la-emos como originando um
acontecimento discursivo na sociedade brasileira. Vamos, agora, procurar compreender
como os sujeitos se constituem na sociedade, tendo em vista os modos de serem
designados, tanto no Estatuto, quanto em outros discursos que circulam na sociedade
acerca das ações afirmativas, como pichações com dizeres contra tais ações.
