I Anais do Simpósio de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa - SILALP - page 70

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O sebo não tinha nada de organizado, pois foi passando de geração para geração,
que contribuíram, como diz o narrador, “para aquele esplêndido caos”.: “Os livros
multiplicavam-se, empilhados pelo chão, ou desalinhados por metros de incertas estantes
em alumínio, sem outra lógica que não fosse a da sua chegada ali.” (AGUALUSA, 2005,
pp.96-97).
Firmino ao questionar sobre a origem do narrador se espanta quando ele lhe conta
que veio de Angola e questiona se na África fala-se português, dando início a discussão
acerca da língua. O velho estranhava o sotaque do narrador, mas não imaginava que fosse
africano, quando aquele lhe explica que em Angola se fala português sim como em outros
países da África e em Portugal. Firmino diz que em Portugal eles não falam português, pois
ele não entende nada. Cabe citar o trecho:
Disse-lhe que sim, que falávamos português, tal como muita gente em
Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, Timor, e,
é claro, em Portugal. Não, isso não, contestou o velho, em Portugal não.
Os portugueses já mal falam português. Na verdade, acrescentou, nem
sequer se pode dizer que falem, isso carece de demonstração. (...)
(AGUALUSA, 2005, p.97).
Para Firmino os portugueses já não falam mais a língua portuguesa, ele ao assistir
um filme diz que não entendeu nada, porque falam com a boca fechada. Na pequena
discussão que se trava entre ambos, o narrador até tenta convencê-lo dizendo que a culpa
seria da qualidade técnica dos filmes portugueses que não são boas, mas depois dá o braço
a torcer e comenta que os filmes portugueses deviam sim ser exibidos com legendas e
acrescenta “não apenas no Brasil mas também em Portugal”. (...) (AGUALUSA, 2005,
p.97).
A terceira personagem que aparece é um português, entra na loja quando os dois
homens discutiam sobre a língua, segundo a descrição do narrador: (...) “Era um homem
franzino, e no entanto sólido e elegante, com o crânio rapado, uma barbicha rala, bem
desenhada, uns óculos de aros redondos, em prata, que deviam ser herança de algum
remoto antepassado.” (AGUALUSA, 2005, págs. 97-98).
Ironicamente o narrador comenta que: “Também ele falava sem abrir a boca”
(AGUALUSA, 2005, p.98), assim como reclamou Firmino sobre os atores dos filmes
portugueses nos quais, segundo ele, não se entende nada justamente porque não abrem a
boca para falar e serem melhor compreendidos.
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