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seus cidadãos por tratar-se de área estratégica. Informou que Fortunato Bulcão estava
voltando para o Brasil com o objetivo de convencer o governo federal a apoiar o
empreendimento, atrair investidores para o negócio, formalizar a fundação da companhia e
iniciar a construção da usina. Solicitou ajuda a Alarico Silveira, para agendar uma reunião
entre Bulcão e o presidente Washington Luis, e pediu segredo sobre o caso. Ainda nessa
carta aparece a indicação de possíveis investidores:
Debati com o Dr. Bulcão o caso e por fim assentamos no seguinte grupo:
Sampaio Correia, elemento técnico, inteligência de primeira ordem; Lage
[Henrique Laje], que ficou assim, assim; Frontin [Paulo Frontin], elemento
político-que-não-cai; Bulcão elemento força-convincente; Victor Konder,
calor da mocidade e o líder da bacia carbonífera da sul; Macedo Soares
[José Carlos de Macedo Soares], pelo comercio e industria de São Paulo;
um Prado, porque a família Prado é pioneira e deve estar associada a todas
as grandes iniciativas do Brasil; Navarro de Andrade, o Ford dos eucaliptos,
o diretor natural do reflorestamento que a empresa vai necessitar para o
futuro. O Dr. Bulcão ficou de ir conversar e expor o caso ao Dr. W. e aos
homens indicados.
(LOBATO, 1970, p. 130).
Monteiro Lobato também comentou sobre seus planos com os amigos
9
Artur Neiva,
Candido Fontoura e Godofredo Rangel, além do cunhado, Heitor de Morais
10
. A estratégia
para viabilizar o negócio e as representações construídas sobre Bulcão, Smith e os Estados
Unidos são muito parecidas com as que foram expostas a Alarico Silveira. No entanto, a
principal diferença diz respeito à imagem que Lobato construiu de si e do governo
brasileiro
11
. Na correspondência mais íntima apresenta-se como um empreendedor
entusiasmado com a possibilidade de enriquecer com o negócio, bem como, demonstra
intenção de associar-se a nova companhia e desejo de abandonar o serviço público e a
literatura. Tanto que confidencia a Heitor: “Um sonho! E como estou sócio de Bulcão creio
que não escapo de ficar milionário”.
Os desdobramentos do negócio, ainda no ano de 1928, podem ser acompanhados
nas cartas de Fortunato Bulcão destinadas a Monteiro Lobato, em 6, 12, 19 e 26 de junho e
11 de julho (BULCÃO apud NUNES, 1985, p. 28-31). Nas quais o destinatário expressa sua
admiração pelo remetente e destaca a afinidade que existe entre eles – “Assim faz gosto
trabalhar. Estamos separados por uma distancia de 12/14 dias, mas nos entendemos como
9
Ver cartas dirigidas a Artur Neiva (TIN, 2007, p. 473-474, 16 de maio de 1928), Cândido Fontoura (TIN, p. 327-328, 29 de
maio de 1928) e Godofredo Rangel (LOBATO, 1969, t. 2, p. 309-316, datadas de 17 de agosto e 28 de novembro de 1928).
10
Cartas de Lobato (1970, p. 132-142) a Heitor de Morais.
11
Lobato (1970, p. 134-135, 4 de julho de 1928) trata da difícil relação com o governo em carta a Heitor de Morais: “Quanto a
governo, presidente, ministros, etc., não pretendo agrada-los, porque não pretendo fazer carreira nem permanecer nesta
humilhante posição de funcionário da coisa mais ridícula e cretina que se possa conceber – governo brasileiro. Chego a ter
nojo de mim, quando penso que estou a fazer parte dessa maquina de tapear o pobre Brasil. E note-se que o governo atual
tem a seu favor uma credencial – é honesto. Mas como é cretino! Sossega. Antes que me removam, removo-me eu para um
business e mando-os todos aquela parte. Não nasci para escravo, decididamente. Tenho sido um mau escravo. Rebelde
sempre, desrespeitador das ordens cretinas e muito independente nas minhas relações com o ministério para que eles me
aturem por muito tempo.”