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fagocitose cultural abordado por Walter Mignolo desmistifica a noção de que a América seria
uma extensão da Europa. Tanto um continente quanto o outro passaram por assimilações
culturais, transformando à América em um “lócus de enunciação, enfatizando a
sobrevivência marginal dos fragmentos europeus e das ruínas ameríndias”
(MIGNOLO,
2003, p. 228). Mas, ao contrário do que se imagina, essas assimilações, tanto de um
continente, quanto do outro, não se deram de forma similar. Os nativos tiveram que tomar
para si, sendo associados e relegados a marginalidade, ao passo que, do outro lado do
Atlântico, as trocas culturais se deram de uma maneira um tanto mais utópico. Tendo em
vista que fagocitose trata de:
Um processo de mão dupla: enquanto a civilização ocidental era
transformada nas margens pelas tradições ameríndias, essas mesmas
tradições geradoras de transformações foram e continuam sendo relegadas
a um segundo (ou terceiro) plano pela promoção hegemônica do “processo
civilizador” durante o período colonial e do “progresso e modernização”
durante o período pós-colonial. (MIGNOLO, 2003, p. 216).
A fagocitose pela qual passou o grupo Brô MC's é visível na sua produção artística
musical, pois se vale de um gênero musical de origem marginal/hegemônica (hegemônica,
pois nasce nos guetos norte-americanos). A “questão não é celebrar glórias passadas, mas
sim como trazê-las para um presente planetário” (MIGNOLO, 2003, p. 222) que, apesar de
marginalizado, o rap advém de uma transculturação para expor as suas problemáticas, e,
por sua vez, critica em seu rap as outras civilizações colonizadoras e hegemônicas.
Cabe ressaltar que, para a fagocitose, há necessidade de pensar no discurso
passando, num resgate ao pensamento do indígena em “transformar perdas em ganhos e
tirar proveito de nossa dupla marginalidade, tornando-a um lugar de onde pensar e falar, um
lugar
onde a vida depende de uma contínua fagocitose cultural sobre uma gnose liminar”
(MIGNOLO, 2003, p. 228). O postulado da fagocitose cultural trata a ideia de que na
América Latina não há como se usar pensamentos classicistas e hegemônicos para se
discutir as especificidades históricas do local, em razão das tantas inerências culturais. A
pós-colonialidade abre, portanto, a possibilidade para se pensar sobre os discursos não
hegemônicos, que até então eram (e, infelizmente, ainda o são, caso contrário não haveria
razão para abordar esses questionamentos) respaldos para a história do local latino.
Considerações Finais
cemitério
terra sagrada para nos é tempo rá
fazendeiro ocupa
não tenho medo de falar
de lá para cá