Anais do VII Encontro do Cedap – Culturas indígenas e identidades - page 199

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décimo sexto versa sobre a participação do biografado na Conferência de Paz de Haia, o
último capítulo se debruça sobre a narrativa do personagem eleito.
Uma das primeiras indicações de que a biografia de Rui escrita por Magalhães não
obedece ao tradicional esquema nascimento, estudos, vida profissional/intelectual, vida
familiar, envelhecimento e morte, está justamente no primeiro capítulo, intitulado “Rui e a
Igreja Católica”.
Neste capítulo, Rui já surge atacando veementemente a Igreja. Ao aparecer em
cena, o biografado conta já com quase 27 anos. Raimundo Magalhães não se preocupa em
narrar o hiato que separa o nascimento de Rui até a sua “irrupção no cenário literário e
político do país” (MAGALHÃES JUNIOR, 1979, p. 13).
Isto já dá o tom que percorrerá toda a obra, não é sobre o Rui privado, aquele do
âmbito familiar, das anedotas dos amigos, mas é o homem público, o intelectual, aquele cuja
atuação política e profissional abrangeu as últimas décadas do Império e as primeiras
décadas da República que ocupará a atenção do biógrafo.
A explicação para que Raimundo Magalhães não escreva sobre outro aspecto da
vida de Rui que não esteja ligado à sua atuação pública seria a própria proposta do autor
em contribuir com um retrato revisionista histórico e político. Isto aponta para o conceito de
biografia que Magalhães tinha em mente. Para ele, uma biografia só valeria a pena ser
escrita se aquilo que fosse narrado, de alguma forma, permitisse entender melhor a época
do biografado ao mesmo tempo que desvendasse um pouco mais a personagem eleita.
A narrativa biográfica e a escrita da história empreendida por Raimundo Magalhães
Junior, em
Rui, o homem e o mito,
segue a ideia de Dosse (2009) no tocante à biografia ser
um gênero híbrido. Todavia, como a preocupação central do autor é compor uma trama
orientada pela “revisão histórica e política” (MAGALHÃES JUNIOR, 1979, p. 7), há sim uma
linha narrativa, com o preenchimento de lacunas por meio da criação artística do autor, mas
o foco é a composição de uma história de vida na qual o método histórico de levantamento,
questionamento e interpretação das fontes esteja em perfeita harmonia com o enredo.
O estilo narrativo de Raimundo Magalhães Junior é leve, envolvente, adquire muitas
vezes um tom irônico, suas críticas apresentam sarcasmo e até mesmo acidez em algumas
passagens. À medida que narra os fatos relacionados à vida de Rui, o autor apresenta os
documentos, com inúmeras citações em notas de rodapé, indicando que qualquer leitor
interessado em conferir as interpretações contidas no texto pode, ele mesmo, consultar de
onde foi que o biógrafo retirou suas conclusões. Andrade (2013) afirma que este seria um
estilo marcante em Magalhães e que o entrecruzamento constante de citações estaria
presente continuamente em suas biografias.
A narrativa não se preocupa com uma ordenação cronológica, mas sim temática.
Conforme dito anteriormente, os capítulos são temáticos e é justamente este caráter que
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