Anais do VII Encontro do Cedap – Culturas indígenas e identidades - page 197

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Levi (1996) se posiciona contra o pensamento de Bourdieu e defende que a biografia
seria um espaço singular de observação e análise das tomadas de decisões, espaço este no
qual transparecem os conflitos entre a racionalidade dos sistemas sociais e a possibilidade
de liberdade de ação dos indivíduos.
A biografia se apresenta, então, como uma possibilidade de revelar as condições
humanas em suas múltiplas diversidades, não engessando os movimentos do sujeito
histórico e nem destacando suas ações, enquanto as de outros indivíduos permaneçam na
obscuridade, ou seja, o estudo das trajetórias individuais permitiria estabelecer certo
equilíbrio ao analisar tanto o contexto em que vivia o biografado quanto as marcas
produzidas por este na sociedade em que viveu, analisar as trocas entre a personagem
biografada e o meio social, e esta linha de pensamento é também compartilhada por Mary
Del Priore.
As críticas de Dosse à postura de Bourdieu enfatizam que tanto a narrativa biográfica
quanto o fazer histórico são ações desenvolvidas não apenas pelo próprio escritor, e
dependem, até certo ponto, dos “elementos ficcionais”. O que une essas ações é o cuidado
que devem ter em relação à realidade sem, contudo, ter a pretensão de compreender a
totalidade dessa realidade.
Para Dosse, há um fator positivo na posição radical de Bourdieu ao defender a ideia
de uma “ilusão biográfica”, seria que essa postura de Bourdieu teria suscitado o
questionamento, entre os que se dedicam a estudar os relatos de vida, acerca da
linearidade presente nas biografias e alertar para a falsa pretensão de historicização que
busca dar sentido teleológico à trajetória do biografado. (DOSSE, 2011, p. 210).
III.
Em dezembro de 1964 é lançada no Brasil a biografia
Rui, o homem e o mito
, de
Raimundo Magalhães Junior. Trata-se do volume de número 27 da coleção
Retratos do
Brasil
lançada pela editora Civilização Brasileira. A obra provoca fortes reações, tanto a
favor quanto contrárias. A intenção do autor é pôr novamente em questão a personalidade,
a mitificação, a carreira política e a atuação diplomática de Rui Barbosa.
A primeira edição de
Rui, o homem e o mito
logo se esgota, sendo lançada no ano
seguinte, 1965, uma segunda edição e mais de uma década depois uma terceira edição.
Neste trabalho, utilizamos a terceira edição, que data de 1979. Os motivos para o sucesso
editorial não se explicam apenas pela celeuma provocada pela obra, seria simplista pensar
assim, mas que a polêmica em torno do livro responde em grande parte pelas vendas, não
podemos duvidar. O sucesso da obra se deu também pela fama que Raimundo Magalhães
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