expressão nos levou a estudar o conceito de imagem poética e seus mecanismos de
construção segundo a retórica. Com auxílio de Octavio Paz, Paul Ricoeur e Maurice
Nadeau foi possível que nos aproximássemos das imagens de Barros: estudamos suas
antíteses, o surrealismo que o influenciou e suas impertinências semânticas
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.
Mas os desenhos verbais de Manoel mostraram-se tão escorregadios para as
definições da teoria quanto o próprio poeta. Percebemos que tratar de imagens retóricas
não abrangia todo o trabalho do pantaneiro: ele pretende construir também imagens
icônicas, com o auxílio das palavras. Assim, acompanhamos ao longo da leitura a
disposição incessante de construir imagens por meio de palavras: ora imagens no
sentido de Ricoeur e Paz, feitas de contradições semânticas, jogos figurativos e questões
linguísticas; ora descrições de telas e cenas, imagens que trazem forte apelo ao visual e
à imaginação, no sentido de construção mental de imagens. Essa duplicidade tornou o
percurso da pesquisa muitas vezes sinuoso, difícil. E, no entanto, encontramos a solução
ao notar que uma condição não impedia a outra: Manoel de Barros constrói, muitas
vezes, imagens que são retóricas e icônicas no mesmo verso. Identificamos, portanto, a
característica imagética como marcante na obra do poeta: além de explorar cada
possibilidade do termo imagem – inclusive a mais literal, quando ilustra alguns dos
próprios livros – ele combina as possibilidades produzindo versos que
são imagens
em
mais de um sentido.
A título de exemplo, temos os seguintes versos, retirados do poema de rodapé O
Caracol, em que o verso inicial é a pergunta “
O que é um caracol?”
e todos os versos
seguintes participam da resposta:
“um caracol é: (...). Pessoas que conhecem o chão
com a boca como processo de se procurarem/ essas movem-se de caracóis!.”
(BARROS, 2010,p.132). Por um lado, existe a questão metafórica do verso , a partir da
qual poderíamos chamar de impertinência semântica,
grosso modo
, o uso do termo
Pessoas
para caracterizar ou explicar o significado de
Caracol.
O estranhamento gerado
aqui nos remete a Octavio Paz e à sua explicação acerca da imagem/verso “pedras são
“a noção de desvio do „sentido ordinário‟ das palavras como meio de dar elevação ao discurso”
(PAES, 1997, p. 228).