Lembrem-se de que nasci no Egito e lá permaneci meus primeiros
vinte anos; são de lá, que me pressionam, as lembranças, que não se
apagam, do lugar testemunha da minha infância e primeira juventude:
sol que alucina, o deserto ilimitado cuja fronteira é o mar ilimitado,
céu constantemente renovado pela luz e pelas miragens e não pelas
nuvens. O Egito é a minha terra nativa. (UNGARETTI, 1964, p.233)
Porém, as imagens presentes no poema também reforçam a ideia de um clarão
que cega. No sentido de, aos poucos, as memórias, as lembranças irem se apagando.
Esse esvaecimento pode estar relacionado com a história de Alexandria, considerada
uma cidade do esquecimento.
Se por um lado, a cidade-deserto é/foi intensa tanto na memória do poeta por
carregar o início de “sua” história quanto na maneira como foi fundada, por outro, é
efêmera por não deixar rastros de seu passado:
Ecco – ci dice Ungaretti – sono nato ad Alessandria d’Egitto, cioè in
uma città che non fa piú parte dell’oasi costituita dal Nilo. Alessandria
è nel deserto, in un deserto dove la vita è forse intensissima dai tempi
della sua fondazione, ma dove la vita non lascia alcun segno di
permanenza nel tempo. Alessandria è una città senza un monumento,
o meglio senza quasi un monumento che ricordi il suo antico passato.
Muta incessantemente. Il tempo la porta sempre via in ogni tempo. È
una città dove il sentimento del tempo, del tempo distruttore è
presente all’immaginazione prima di tutto e soprattutto.
(UNGARETTI, 1969, p. 497)
O retorno às origens pode ser acentuado pela sensação de ir e vir do “Ricordo”
nos sons nasalizados e as aliterações /m/n/ também sugerem um prolongamento
temporal, seja de permanência, seja de ausência.
Novamente, a potência da “luz” solar parece romper com os limites de espaço e
de tempo
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, eternizando o instante na imagem poética.
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Sobre este poema, diz Mussara: “la potenza del sole, che riesce a rapire ‘la città’, porta ad’un
apparente eliminazione dello spaziale e del temporale: ‘Neanche le tombe resistono molto’”, em
Risillabare Ungaretti
, p. 49.
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