ROSAS EM CHAMAS
Sobre um oceano
que tilinta
repentina
voga uma outra manhã
“Rose” em italiano possui dois significados distintos dependendo da forma como
é pronunciada. Com a vogal “o” fechada, a palavra possui o sentido de rosa, “il fiore”. E
com “o” aberto, denota “erosione”
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.
Portanto, na primeira leitura, a imagem poética expressa a miragem luminosa da
manifestação de uma nova manhã, cujo sol é metaforizado no título ‘Rose in fiamme’
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.
É outro dia que se almeja. Um que por essência seja diferente daquele no qual se está
inserido, a ilusão de que esse novo traga consigo a esperança. Ou, ainda, uma nova
manhã que sobrevive num período de trincheiras. O “‘sentimento’ del tempo si accentua
nelle liriche” (MUSSARA, 1992, p.61), afinal, Ungaretti era “quell’uomo di pena e
soldato della speranza, servitore della speranza” (UNGARETTI, 1969, pp. 527-28),
como se autodefinia.
Já na segunda, a imagem reforça a ideia de um bombardeio potencializado, se se
pensar nesse soar, que de súbito flutua numa “outra manhã”, como os alertas
inesperados da guerra. O clima de instabilidade é acentuado pelo flutuar, deslizar e
consequente ausência de uma superfície terrena, “chão firme”, em que o tiroteio pode
ser pressuposto na recorrência do agudo da vogal “i” e suas implosões sugeridas no som
do “o”. Outra vez, é dito o indizível, as balas de fogo suspensas no ar, através das
imagens que ultrapassam os limites da linguagem.
“Rosas em chamas” pode também exprimir o ato do fazer poético “em meio à
lama da trincheira”, uma vez que “flor”, desde Novalis, pode ser metáfora de “poesia”,
de “mensagem poética”
12
.
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Consultado no dicionário italiano
Lo Zingarelli
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11
Vallone il 17 agosto 1917// Su un oceano/ di scampanellii/ repentina/ galleggia un’altra mattina, em
A Alegria
, p.152.
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Na análise do poema “Eterno”, de Ungaretti, Franco Mussara diz “Il termine ‘fiore’ inoltre si pone
semanticamente sul livello del ‘bello, gentile, profumato’, ma da Novalis in poi anche su quello
metaforico della ‘poesia’, del ‘messaggio poetico’”, em
Risillabare Ungaretti
, p.42.