foco, de modo a intrigar ainda mais o coenunciador. Outro exemplo dessa estratégia
diversionista encontra-se no segmento a seguir.
Então, Diadorim veio me fazer companhia. Eu estava meio dúbito. Talvez, quem tivesse
mais receio
daquilo
que ia acontecer fosse eu mesmo. Confesso. ... Mas Diadorim
estava nos suaves. ... Que vontade era de pôr meus dedos, de leve, o leve, nos meigos
olhos dele, ocultando, para não ter de tolerar de ver assim
o chamado
, até que ponto
esses olhos, sempre havendo, aquela beleza verde, me adoecido, tão impossível.
Dormiu-se bem.”(p.38)
Depois de explicitar seu desejo de contato físico – e de considerá-lo
“impossível” – o narrador informa laconicamente que “Dormiu-se bem”, ao contrário do
que se poderia esperar, sobretudo pela referência ao “chamado”. Além disso, a
ambiguidade de “daquilo”, já firmado no discurso como o referente de algo feio, que
Riobaldo tanto temia, permite inferir que se trata de medo do amor por Diadorim,
conforme se verá no próximo segmento.
Eu estava todo o tempo quase com Diadorim.
Diadorim e eu, nós dois.... De nós dois
juntos, ninguém nada não falava. Tinham a boa prudência. Dissesse um, caçoasse, digo
– podia morrer...
Por mim, só, de tantas minúcias, não era capaz de me alembrar [...]
mas a saudade me alembra. Que se fosse hoje. Diadorim me pôs o rastro dele para
sempre em todas essas quisquilhas da natureza. ...
Diadorim ... tão bonito no relume das
brasas
. ... ele estava ali, mais vindo, a meia-mão de mim. E eu –
mal de não me
consentir em nenhum afirmar das docementes coisas que são feias
– eu me esquecia de
tudo num espairecer de contentamento, deixava de pensar. (p.25)
Ao mesmo tempo em que fornece informações sobre a suspeita do grupo, o enunciador
ratifica o sentimento de saudade, mas expõe também sua opinião sobre a atração que sente por
Diadorim: “das docementes coisas que são feias”. Ao afirmar sua rejeição ao relacionamento
“
feio”, recorrente em toda a narrativa, Riobaldo modaliza sua afirmação com
“docemente”.
Nesse mesmo nível de preocupação, insere-se o pássaro “bem-te-vi”, cujo canto
é visto como acusação de “más-horas” que a personagem
ainda
não tinha vivido: “E
permaneci duvidando que seria – que era um bem-te-vi, exato, perseguindo minha vida
em vez, me acusando de más-horas que eu ainda não tinha procedido. Até hoje é
assim...” (p.28)
Por força do operador “ainda”, as informações até aqui fornecidas ao
coenunciador permitem que este construa a expectativa de que as “más-horas” de fato
aconteçam. Assim, a tensão vai crescendo e a construção de Diadorim vai adquirindo