Considerando, pois, as múltiplas facetas da autora que ocupava diferentes posições no
processo de produção literária, e levando em conta também o sentido geral da sua obra,
por conta do seu posicionamento no campo discursivo, podemos reconhecer pelo menos
quatro traços que definem sua condição paratópica associados dinamicamente entre si: a
feminilidade, o deslocamento e a língua.
Feminilidade/ deslocamento/ língua
Cecília Meireles, figura feminina, no ambiente autoritário dos anos 30, em que
predominava a supremacia masculina no âmbito cultural e político era tida como uma
figura deslocada (fora do centro). “” A pertinência ao campo literário não é, portanto, a
ausência de qualquer lugar, mas antes uma negociação difícil entre o lugar e o não-
lugar, uma localização parasitária, que vive da própria impossibilidade de se estabilizar
“” (Maingueneau, 2001, p.28).
A partir da problemática do não-lugar, como traço fundamental da paratopia passamos
agora a tratar do caso particular de Cecília Meireles. Sua imersão no campo literário
parece legitimar-se precisamente por um não-lugar e desta condição emerge a própria
identidade da escritora que “”articula uma dialética incessante: negar-se obsessivamente
pela multiplicidade existencial. Interessa-se pela variação do ser; a surpresa da
variedade mesmo”” (Meireles, 2010, p.16). Assim, sua enunciação constitui-se através
da impossibilidade de lhe atribuir um verdadeiro lugar no espaço literário.
Sabe-se que cada época legitima um saber diferente da época anterior. Entender o
processo criativo de Cecília Meireles é entender a prática discursiva que se colocava na
fronteira dos conflitos simbólicos que se chocavam na sociedade. Cumpre, assim,
examinar a atividade pela qual Cecília Meireles se materializa no campo literário. Sua
trajetória permeava as linhas demarcatórias do espaço social, trilhando caminho não
convencional, sem se enquadrar nos cânones da cultura oficial. Desse modo, foi motivo
de indiferença, de resistência e de perseguição.
Os
Problemas da literatura infantil
são um exemplo paratópico, nos anos 1950, pois o
conceito de literatura infantil, configurado por Cecília Meireles, se afastava do centro