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Albertina largou o serviço e correu para onde se formara um ajuntamento.
Mas logo se deteve. Fechou os olhos, soltou um longo “uai”, e caiu de
cócoras, escondendo o rosto entre os joelhos.
A larga correia de uma transmissão, que fazia funcionar todo um grupo de
teares, alcançara um rapazelho de quinze anos pelo braço, atraíra-o para a
roda, suspendera-o no ar e arremessara-o violentamente sobre a parede
que a pequena distância se encontrava. Quando o corpo veio dar no chão,
estava já sem vida, o crânio extensamente fraturado.
[...]
Vendo o braço do menor jogado para um lado, o seu craniozinho achatado,
de onde escorria o sangue e uma pasta esbranquicenta, o rosto do diretor
contraiu-se todo, num esgar de repulsa e de emoção. Mas foi um rápido
minuto. Logo retomou suas funções de chefe. (FONTES, 2003, p. 140).
Nota-se a descrição em pormenores do fato, como uma câmera que vai registrando o
momento e faz o leitor visualizar tal imagem de horror, crueldade e frieza, adjetivos cabíveis
a essa cena, na qual se percebe que a única intenção do horror foi mostrar a injustiça contra
aqueles que não têm condições sociais, como o menino que morreu. Não foi dito seu nome,
pois se julga que num espaço como aquele, onde as pessoas sofrem injustiças, pouco
importa quem elas são, ou seja, a identidade delas, então o nome que é o mais importante
na identidade de cada um não é revelado, feito proposital pelo narrador.
O chefe da Têxtil, por ocasião do acidente, pareceu ter um instante de
sentimentalismo, o que realmente não passou de um brevíssimo momento, mostrando, além
do mais, que aqueles também sem condições não têm reserva nem a sentimento, são vistos
como objetos, seres produtores, úteis, senão descartáveis.
A mãe do menino, apenas um menino de quinze anos que morreu, também
trabalhava na fábrica, foi surpreendida terrivelmente pela morte do filho. Ela ouviu grande
tumulto e questionava quem havia morrido, descobriu então que foi seu filho e entrou em
desespero e foi junto ao corpo, onde o capitão Cisneiros interviu dizendo que ela deveria se
conformar, pois: “– A vida é assim mesmo”. Tem-se aí uma fala típica direcionada aos
injustiçados, que só resta a eles se conformarem.
Outro caso é o da personagem secundária Clarinha, que foi obrigada pela mãe a
trabalhar doente na Têxtil, pois provinha da menina o sustento do lar. Também Bela
Corumba que estudava junto com Caçulinha, a filha Corumba mais nova, eram as únicas
que estudavam da família, no entanto Rosenda fugiu com o namorado, seguida de Albertina
que também deixou o lar, indo embora com o namorado, um médico. Por esta razão, Bela e
Caçulinha foram trabalhar na fábrica.
Portanto, vê-se que o romance, de forma profunda e dramática, trabalha com vidas
humanas, obrigadas pela injustiça social a sujeitarem-se a pouco, para não dizer a nada. O
artista resgatou, em seu romance, aqueles esquecidos pelos governadores e pela sociedade
no geral.