Anais do VII Encontro do Cedap – Culturas indígenas e identidades - page 220

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jornais sobre assuntos relacionados ao anarquismo e apreciava ler uma literatura mais
“subversiva”, de autores mundialmente consagrados como Émile Zola, Bakunin e Kropotkin.
Seu pai, o Sr. Ernesto, tinha o hábito de ler alguns jornais com conteúdos políticos como
A
plebe
,
A lanterna
, entre outros, sendo adepto deste sistema de ideias, não aceitava e não
acreditava em nenhum tipo de instituição como a religião e o Estado, por exemplo, pois
considerava que tais instituições eram as responsáveis por tirar a liberdade e oprimir o povo.
Por meio deste contato com o anarquismo, com a literatura libertária que a sua mãe
apreciava ler e com a leitura de seu pai, além da participação em manifestações
acompanhando-os e com a classe operária, é que Zélia adquiriu, desde muito cedo, uma
consciência política e social. Uma consciência que lhe permitiu perceber as diferenças
sociais, econômicas e culturais entre as pessoas que retratou nesta primeira publicação.
Além desta consciência política, Zélia percebeu, de uma maneira bastante difícil,
qual era a consequência de quem tinha ideais anarquistas, num país como o Brasil, durante
o Estado Novo, período que em que seu pai acabou sendo preso justamente por ser
rotulado como um homem perigoso, por ser “comunista”, estrangeiro, por portar uma velha
espingarda de caça em sua casa e por possuir um material literário extremamente
subversivo que eram os livros de Émile Zola, Pietro Góri, encadernados na cor vermelha,
além de portar artigos com conteúdo político:
Na época do Estado Novo, bastava uma denúncia ou simples suspeita para
que uma casa de família fosse cercada por enorme aparato bélico, policiais
apontando metralhadoras, os lares invadidos – a qualquer hora do dia ou da
noite – por policiais armados, pais de famílias arrancados de seus leitos e
arrastados para as masmorras, para o porão úmido e escuro da Delegacia da
Ordem Política e Social, incomunicável. Foi o que aconteceu á minha família,
foi o que aconteceu a meu pai. O chefe das “batidas”, o perito nos
interrogatórios era nosso ex-vizinho Luiz Apolônio. (GATTAI, 2009, p. 283).
Neste trecho, fica evidente o quanto o Estado Novo temia e combatia qualquer tipo
de pessoa ou de grupo que tivesse ideais anarquistas ou comunistas, pois era uma grande
ameaça a este Estado que acabava de ser constituído. Leis foram criadas para combater
todo e qualquer tipo de manifestação, o grande medo deste Estado, era de uma revolução
que destruísse o seu poder:
Intimidados pelas idéias e pelas práticas libertárias e posteriormente pelas
idéias comunistas – os republicanos radicalizaram avançando contra a
anarquia. Preocupado com a circulação de ideias sediciosas, o Governo
Provisório emitiu, em 23 de dezembro de 1889, o primeiro decreto de
censura que atingiu diretamente a imprensa. Restringia-se a informação,
assim como proibia-se reuniões políticas que atentassem contra a nova
republica laica e liberal. Em 1907, os anarquistas já não eram vistos com
bons olhos pelas autoridades policiais que os acusavam de “agitadores do
ofício pagos por governos estrangeiros”, de “fazer manobras subversivas” e
“provocar a greve entre os trabalhadores. (CARNEIRO, 2002, p.4).
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