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aparentes mudanças nas concepções sobre a literatura não ocorreram simplesmente
porque o autor mudou de ideias. Na verdade, a sua crítica evoluiu de acordo com os
problemas literários de cada época, assim como “o regionalismo foi uma etapa necessária,
que fez a literatura, sobretudo o romance e o conto, focalizar a realidade local” (CÂNDIDO,
1989, p.159). No início, o maior problema era a excessiva europeização da literatura, que
Machado combate em seus dois textos críticos inicialmente levados em conta aqui. Em
seguida, percebendo o movimento dos autores nacionais de evitar uma “invasão” da
literatura europeia enquanto tentam criar uma literatura nacional, movimento que culminou
nos nacionalismos exagerados (ou regionalismos pitorescos, para usar a expressão de
Antonio Cândido), Machado novamente se coloca contra a concepção desses autores em
“Instinto de nacionalidade”.
Portanto, tendo escrito Helena três anos depois do
Instinto de nacionalidade
,
dezessete anos depois de “O Folhetinista”
e dezoito após “O passado, o presente e o futuro
da
literatura”, fica difícil não acreditar que Machado de Assis tenha construído o romance
tendo em vista os preceitos estéticos que ele mesmo estipulou em sua crítica literária. Ou
seja, valendo-nos desse contexto, podemos rever
Helena
pensando sua nacionalidade e
seu diálogo com a literatura mundial. Podemos notar a “cor local” desse romance na sua
relação com a história do país, na crítica aos senhores de escravos representados pelo
Conselheiro Vale e, em seguida, por Estácio, e na relativização do pensamento senhorial
pela personagem Helena (CHALHOUB, 2003). Também se pode notar o tratamento das
questões nacionais nas passagens em que o escravo Vicente, pajem da protagonista,
aparece também como elemento relativizador das concepções imutáveis do senhor Estácio.
A personagem Helena, assim como seu pai Salvador e Vicente, simbolizam os
dependentes que vivem dos favores dos senhores donos de escravos, e essas relações, já
analisadas por Schwarz em outras obras de Machado, também são muito importantes para
o entendimento das relações sociais no Brasil oitocentista.
Helena também era uma personagem que representava a mulher brasileira em sua
diversidade. Ela é uma espécie de representação da nova mulher e símbolo de um
movimento feminista que dava seus primeiros passos no Brasil. Era inteligente e tinha sua
autonomia, além de desafiar sutilmente a autoridade de seu protetor Estácio, embora
também tivesse habilidades (tocava piano, falava outras línguas, andava a cavalo etc.) que
eram impostas às mulheres da época para que lhes servissem como dote em um
casamento. Ela também era uma mulher com características românticas, o que pode estar