exemplo, os inúmeros problemas enfrentados pelos futuros trabalhadores (a inexistência
de empregos, os baixos salários, a exploração da mão de obra). "É improdutivo só
constatar que há crise, o que importa é agir sobre ela, enfraquecendo-a” (Romano,
1999, p.09). Não veem nisso, porém, um traço da exclusão social, produzido pela
despreocupação de alguns setores da sociedade, (como determinados políticos e
determinados empresários) com o desenvolvimento e a geração de emprego. Quando
reconhecem essa faceta, entretanto, é para situá-la num espaço histórico e temporal
bastante restrito: "Neste momento em que a sociedade e o governo discutem formas de
se combater a miséria e o desemprego, o
CEFET/Pr. tem cumprido sua missão social,
fomentando a qualificação profissional para o mercado de trabalho” (Ongaratto, 1999,
p. 14). Tratar o problema da miséria e do desemprego em termos umbilicais, como se
estivéssemos isolados do contexto nacional, é deixar-se levar por uma ilusão produzida
pelos discursos que nos formaram. Uma mirada retrospectiva, porém, nos ajuda a
entender que não são ‘naturais’, mas construídos milenarmente.
O fato de remeter à ‘missão social’
por si só não garante a positividade que o
locutor pretende, uma vez que ‘missão’, como qualquer outra palavra, precisa ser
dialogizada. É possível que ele saiba exatamente a que se refere quando a utiliza, quais
os valores nela implícitos. Mas a simples menção à palavra não é suficiente para
garantir a especificidade desse argumento, uma vez que por mais que a palavra ‘missão’
receba empregos diversos, tem sempre um efeito de sentido positivo, um valor
consagrado, um bem desejável. Quem ousaria contrapor-se a ela? Sempre é bom
lembrar que não há um acordo universal a respeito das palavras. Mas observamos que,
apesar disso, há uma aura que permanece inabalável, intacta, inalterada por mãos
humanas que, segundo as circunstâncias e os interesses, são chamadas a significar de
modo indiscutível. O fato de remeter a um padrão moral positivo tem em comum com a
prova moral, o fato de que dispensa seu usuário de elaborar provas específicas (aquelas
que Aristóteles chamaria de provas objetivas). A argumentação da ‘missão’ se esgota
nela mesma, na referência a um padrão
a priori
, uma razão oculta e acima do texto, pois
quando fala em missão, o efeito básico deste tipo de argumento é, paradoxalmente, a
suspensão da criação de argumentos pelo texto. Em termos mais gerais, pode-se dizer
que o seu efeito é o de descaracterizar o ato de linguagem. Ou seja, na prática, o que ele
faz é reduzir o seu discurso ao enunciado de uma ordem - que, com certeza, não foi ele
que ditou. Essa ordem, instaurada pela noção de ‘missão’, não passa de um eco de