alteridade? Que modos de fragmentar e de experimentar o dentro e o fora, de inventar e
descobrir, de unir e separar acabaram fazendo de nós seres adeptos da delimitação,
devotos da finitude, apegados à determinação, isto é, seres reivindicadores de
identidade?(...) (1998, p. 136).
O ponto de vista absoluto e universal da única voz, da vontade de verdade
constitui, assim, uma exclusão do ‘outro’, ao ganhar universalidade e permanecer como
‘a’ interpretação que fixa, reproduz e reacentua o caráter monológico. Para construir
essa cultura hegemônica monológica, as reproduções de estereótipos e de clichês são
mecanismos utilizados para perpetuar a subordinação. Assim é que todo aquele que não
se enquadrar nas categorias apregoadas como universais
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, são expurgados.
Reconstruídos como totalidade,
os indivíduos perdem sua singularidade. Nesse ponto, é
preciso esclarecer: como é possível ser social e singular ao mesmo tempo? Segundo
Bakhtin, o ser humano é um ser social, dadas as infinitas e múltiplas vozes sociais que o
circundam, atravessadas por uma tensão permanente entre o devir e a história; mas é
dessa imensa diversidade de vozes e de suas relações dialógicas que emerge como
possível a individualidade, que se constituirá explorando o espaço infindo da tensão
dialógica das vozes sociais. Nos textos pesquisados temos a figura do empreendedor
construída monologicamente. Uma leitura dialógica desses textos revela, então, que o
monologismo é uma forma de discurso ‘canibalístico’ que tenciona reduzir o mundo em
uma única e racional ordem de totalização. ‘Canibalístico’ porque, quando falamos em
nome de outros, tentando assumir suas vozes e experiências, a intenção é ‘engolir’ suas
histórias, pensamentos, posicionamentos, etc...(Zavalla, 1993). Este monólogo é falado
em nome da razão, da civilização, da cultura, ou do gênero e oferece verdades
definitivas, em uma linguagem que se pretende transparente e não problemática.
A forma monológica de percepção do conhecimento e da verdade (...) só surge onde a
consciência é colocada acima do ser e a unidade do ser se converte em unidade da
consciência.(...)
Com base no monologismo filosófico é impossível uma interação substantiva de
consciências, razão pela qual é impraticável um diálogo substantivo. Em essência, o
idealismo conhece apenas uma modalidade de interação cognitiva entre as consciências,
ou seja, o sujeito que é cognoscente e domina a verdade ensina ao que não é
cognoscente e comete erros, vale dizer, conhece a inter-relação entre o mestre e o
discípulo e, conseqüentemente, apenas o diálogo pedagógico (Bakhtin, 1981, p. 68).
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Um universal é uma qualidade ou propriedade que cada membro individual de uma classe de seres deve
possuir para que a mesma palavra possa ser aplicada a todas as coisas nesta classe.