Anais do 1º Colóquio Internacional de Texto e Discurso - CITeD - page 591

Nesse sentido, levando em conta que é insuficiente apenas definir
etimologicamente a palavra empreendedor, pelas considerações acima, seria interessante
perguntar: emprendedor de quê? Para quê? Por sua vez, a dispersão dos discursos
permite que suas fronteiras não estejam de tal modo demarcadas que não sejam
‘invadidos’, ‘misturados’, com outros discursos. Assim é que encontramos ecos da
submissão do homem ao discurso religioso, bem como ecos do discurso econômico, do
discurso científico, do discurso medieval, no interior de discursos tidos como
contemporâneos ou modernos. Pela memória discursiva - o interdiscurso - sustentamos
o dizer em uma estratificação de formulações já feitas mas esquecidas, e que vão
construindo uma história de sentidos. É sobre essa memória, de que não detemos
plenamente o controle, que nossos sentidos se constroem, dando a impressão de que
sabemos exatamente do que estamos falando, a ilusão de que somos a fonte de nosso
dizer. Esse ‘apagamento’, essa ‘não- lembrança’, por sua vez, é necessária para que o
sujeito se estabeleça num lugar possível do movimento da identidade e dos sentidos:
eles não retornam apenas, eles se projetam em outros sentidos, uma vez que a forma-
sujeito é determinada, mas a linguagem é indeterminada e vaga, sujeita a equívocos, o
que não constitui um ‘defeito’ da língua, mas é próprio dela. "A estabilidade e a
transparência da linguagem são exatamente circunstanciais. Não são constitutivas da
língua, nem do discurso" (Possenti, 1999, p. 221).
Desse modo, para que minhas palavras façam sentido, é preciso que elas já
façam sentido. E isto é efeito do interdiscurso: é preciso que o que foi dito por um
sujeito específico, em um momento particular se apague na memória para que, passando
para o ‘anonimato’, possa fazer sentido em minhas palavras. É isso que dá aos sujeitos a
possibilidade de se subjetivarem, uma vez que fazemos isso determinados por nossa
relação com a língua e com a história, por nossa experiência com o universo simbólico.
Sempre, do que dizemos, só uma parte é acessível ao sujeito, pois mesmo o que ele não
diz (e que muitas vezes ele desconhece) significa em suas palavras, convocado pelo
dizer. Isso ocorre porque as palavras não são propriedade particular de ninguém, elas
significam pela história e pela língua. O que é dito em outro lugar também significa nas
‘nossas’ palavras. É um saber que não se aprende, não se ensina, mas produz seus
efeitos de sentido.
Assim, se há determinação da forma-sujeito, não há dos sujeitos, dos sentidos,
da linguagem, (do simbólico), sempre incompletos, ainda que todo sentido se filie a
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